quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

O RICO E LÁZARO

 

O RICO E LÁZARO

(Luc. 16:19,31 – “Certo homem era rico e se vestia de púrpura e linho finíssimo, e leviano banqueteava-se todos os dias alegremente.  Certo mendigo, de nome Lázaro, todo em chagas, fora deitado diante do ádrio dele, desejando saciar-se com o que sobrava da mesa do rico; mas até os cães vinham lembre-lhe as úlceras. Aconteceu, porém, morrer o mendigo e ser levado pelos espíritos ao seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado. No Hades, estando em provação, levantou seus olhos e viu Abraão ao longe, e Lázaro em seu seio. E ele chamou, dizendo: Pai Abraão, compadece-te de mim e envia Lázaro, que mergulhe na água a ponta de seu dedo e refrigere minha língua, porque muito sofro nestas chamas. Abraão, porém, respondeu: Filho, lembra-te de que recebeste teus bens em tua vida, e igualmente Lázaro os males; agora, pois, ele foi aqui consolado, mas tu sofres; e nestas regiões todas, entre nós e vós estabeleceu-se imenso abismo, de tal forma que os que querem passar daqui para vós, não podem, nem os de lá passar para nós.  Ele disse: peço-te, então, ó Pai, que o envies à casa de meu pai, porque tenho cinco irmãos; de modo que os avise, para que também eles não venham a este lugar de provação.  Mas disse Abraão: Eles têm Moisés e os profetas: que os ouçam. Retrucou ele: Não, Pai Abraão, mas se alguém dentre os mortos for a eles, mudarão a mente.  Respondeu Abraão: Se não ouvem Moisés e os profetas, mesmo se se levante alguém dentre os mortos, não se persuadirão”).

Aqui deparamos outra parábola com ensinos seguros a respeito do plano astral, como consequência imediata da vida neste plano terráqueo. Temos a impressão, por isso, de que as duas foram narradas seguidamente, pois havendo falado nas casas (vers. 4) deste Eon (vers. 8) e nas tendas do (outro) Eon (vers. 9), era interessante, e até conveniente, que o ensino prosseguisse no esclarecimento das realidades ocorrentes em uma e outra localização das criaturas. Alguns pais da igreja julgaram tratar-se de fato verídico, como se depreende da versão copta sádica e de um estilo do grego, que dão o nome de Neve ao rico, denominado Pneas por Prisciliano (Tractatus IX) e pelo pseudo-Cipriano (De Pascha Comp., 17). A dedução é feita em virtude de constar o nome Lázaro, pois não É da técnica parabólica a citação de nomes próprios. No entanto, justifica-se o aparecimento do nome, já que não poderia mais designar-se pôr o mendigo, quando este tivesse chegado nova situação no seio de Abraão. Destaca o ensino, o contraste entre a grande riqueza e a extrema miserabilidade. O manto de púrpura e as técnicas de linho fino (byssos) eram a roupa normal dos grandes ricos da Época. E o banquetear-se alegremente (euphraínô) confirma o padrão elevado de vida.

Ao lado disso, aparece o pobre, com o nome apropriado de Lázaro (diminutivo de Eleazar, que significa Deus ajuda). Descrito como mendigo (ptôchós) que, além de nada possuir, se achava coberto de chagas (eílkôménos) e permanecia deitado, sem poder movimentar-se, de tal forma que nem conseguia afastar os cães que lhe vinham lamber as úlceras. O verbo bállô, no mais que perfeito passivo, de sentido continuativo (ebéblêto) indica que ali fora deitado e ali continuava sem de lá sair. E disso deduzimos que, quando ele desejava saciar-se com a sobra da mesa do rico, ele o conseguia. Não fora assim, teria buscado outro local. Não corresponde, pois, realidade o acréscimo da Vulgata Clementina: et nemo illi dabat (e ninguém lhe dava), sem nenhum apoio nos códices gregos. Provavelmente foi para a trazido da parábola do filho pródigo (Luc. 15:16). Portanto, embora não cuidado com amor, era diariamente alimentado pela criadagem do rico que, por isso, se sente encorajado a pedir de Abraão que permita que Lázaro lhe retribua os pequenos favores prestados. Preferimos, na tradução, o que sobrava da mesa do rico (tõn piptóntôn apò tes trapézês tou plousíou), à precisão as migalhas (tõn psichíôn) que caíam, expressão que aparece em numerosos manuscritos. No entanto, os mais antigos e mais seguros omitem-na (papiro 75, Sináptico, Vaticano, régio, versões itálicas e coptas saÌdica e boaÌdica, e os pais Clemente, Adamancio, Ambrósio e Gaudencio). Lázaro, afinal, larga seu corpo chagado e é conduzido pelos espíritos protetores ao seio de Abraão. Mais tarde também o rico abandona o corpo nédio, que é sepultado com as honras de praxe. Aqui também a Vulgata trouxe, por paralelismo, o início do vers. 23 para o final do vers. 22, sublinhando a oposição entre o pobre no seio de Abraão e o rico sepultado no interno. Mas não há justificativa em nenhum original grego. Inclusive o tratamento trocado entre Abraão, que chama o rico de filho (tékna) e este que a ele se dirige respeitosamente como pai, demonstra que o rico não estava no inferno. A crença israelita da Época dizia que todos os desencarnados se localizavam num só sítio, o cheol (em grego Hades, que é o termo aqui empregado), que se dividia em vários planos, pois lá se encontravam bons e maus, santos e criminosos, patriarcas e ladrões e todos se viam e podiam comunicar-se. Não era, portanto, em absoluto, a ideia de céu e inferno que posteriormente se formou em muitas seitas cristãs. A expressão seio de Abraão, isto é, regaço de Abraão era o plano mais elevado, dirigido pelo patriarca fundador e pai de todos os israelitas. Mas não se pense que os espíritos desencarnados eram literalmente carregados no colo, pelo velho patriarca ... Conforme vemos, a descrição feita por Jesus do mundo astral é muito mais conforme aos ensinos espiritistas que a outras teorias: o plano é o mesmo, só existindo, entre os diversos níveis, uma distância vibratória; elevada e trazendo bem-estar aos que haviam descarregado na vida física, pela catarse, todos os fluidos pesados agregados ao corpo astral; e trazendo sofrimento, por sua vibração baixa e portanto carregada de calor e queimante com o fogo purificador, aos que haviam transcorrido vida viciada no plano físico. Permanecendo, pois, no Hades, em provação (básanos, o lápis Lydius dos latinos, era uma pedra de toque, com a qual se reconhecia o ouro. Trata-se, portanto, da experimentação ou provação a que são submetidos os desencarnados que necessitam purificar-se) sofria a dor da limpeza pelo fogo purificador que queima os agregados do corpo astral. … quando levanta os olhos e vê Abraão e, no círculo por ele governado, o ex-mendigo Lázaro. Lembra-se de que, na Terra, ele o favorecia com os restos de sua mesa e lhe permitia ficar deitado junto ao portão de sua casa. Suplica, então, que Abraão lhe envie Lázaro, após mergulhar o dedo na água, a fim de trazer-lhe um pouco de refrigério, pois o que mais o martiriza é a sede. Pede pouco (uma gota d'agua) porque também dera pouco (as sobras apenas). Responde Abraão a seu filho que sofre, explicando-lhe o mecanismo da Lei de causa e efeito. O rico recebera todas as facilidades, e delas se servira abusivamente, não cogitando de, com ela, servir generosamente. Agora tinha que suportar a dor da limpeza, para purificar-se e evoluir. No entanto, essa fase j· fora superada por Lázaro, que fizera sua purificação através da mesma dor na vida terrena. J· pronto, achava-se agora reconfortado. Ambos tinham que sofrer as mesmas operações. Mas enquanto Lázaro as suportara no corpo, o rico preferira aproveitar sua existência em gozos e prazeres, adiando a limpeza para o plano astral - Tivesse, pois, paciência. Completando a ilustração, explica-lhe que em todas aquelas regiões (en pãsi toútois) h· verdadeiros abismos vibratórios entre um plano e outro, tirando qualquer possibilidade de transitar-se de um a outro: o rádio de onda longa não tem possibilidade de sintonizar a onda curta, nem vice-versa; h· entre as duas frequências. verdadeiro abismo. O rico compreende a lição e conforma-se. Mas, possuidor de bons sentimentos, recorda-se de que deixou encarnados no planeta mais cinco irmãos, que moram com seu pai. E preocupa-se com o futuro estado deles. Se a dificuldade de ele receber o alívio reside na distância vibratória imensa, certamente esse empecilho não existir· entre o Hades e o plano físico. Lázaro não poderia aparecer na casa de seu pai terreno para avisar a seus irmãos? Abraão faz-lhe ver que, na Terra, seus irmãos já receberam toda a elucidação possível da parte de Moisés e dos profetas, cujas obras costumam ouvir lidas aos sábados nas sinagogas. Essa orientação lhes é suficiente para dirigir corretamente suas vidas. Mas o rico, que desencarnara havia pouco, lembra-se bem de que também ele não dera atenção a Moisés e aos profetas: a leitura daqueles textos consistia simplesmente numa rotina tradicional, sem qualquer influência maior na prática da vida. E se algum defunto aparecesse causaria tamanha sensação, que certamente eles ficariam alertados e acertariam o rumo de suas existências, pois mudariam a mente, renovando suas crenas. Mas Abraça-o; conhece bem a humanidade. E sabe que, mesmo depois de 2.000 anos. ainda continuar· igual: de nada adiantar· o aparecimento de fantasmas, por mais comprovado que seja: todos quase continuar os descrentes, duvidando de tudo. Não seria a aparição de espíritos que os persuadir (como até hoje ocorre). Terão que modificar-se de dentro para fora, e não com acontecimentos exteriores, por mais sensacionais que sejam. Verificamos, pois, que o rico não é condenado pelo fato de não haver atendido ao pobre - porque, embora minimamente, ele o atendeu - mas é ensinada, apenas, através do contraste chocante de situações na terra e no plano astral, a lei de causa e efeito, que age nos dois planos (físico e astral) que são interligados e interpenetrantes. A lição é por demais preciosa, sobretudo por vir trazer confirmação de muitas obras espiritualistas (Antônio Borgia, Francisco Cândido Xavier, Yvonne A. Pereira e muitos outros) que são recusadas pelas igrejas ortodoxas.

FONTE

C. TORRES PASTORINO

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