HIPÓTESE DA ORIGEM ÚNICA
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Mapa das migrações humanas primordiais de
acordo com a genética de populações mitocondrial (números
são milênios antes do presente) (a
precisão deste mapa é discutida).
Hipótese da origem
única (no inglês recent
single-origin hypothesis, ou RSOH), também chamada de Modelo "Fora da
África" (no Inglês "Out of Africa", ou OOA), Hipótese
da Substituição ou Origem Recente Africana (no inglês Recent
African Origin, ou RAO) é o modelo da Paleoantropologia mais
amplamente aceito para a origem humana, corroborado por evidências fósseis, genéticas e linguísticas, que
indicam que todos os seres humanos hoje vivos descendem de um grupo de Homo sapiens originado
na África, sendo as estimativas de datas de coalescência mais atualizadas,
obtidas a partir de pesquisas genéticas, 143 e 190 mil anos atrás para as linhagens materna e paterna,
respectivamente, porém com que é chamado Humano Anatomicamente Moderno (no
inglês Anatomically Modern Human, ou AMH) tendo se originado entre 100 e 300
mil anos atrás (vide Tabela 1). Os descendentes desse grupo posteriormente
se dispersaram pelo mundo em diferentes ondas migratórias, constituindo as
linhagens que deram origem aos povos viventes de todos os continentes, tendo a maior
e mais significativa dessas ondas migratórias se iniciado por volta de 60-75
mil anos atrás.
O modelo original propunha que
esses Homo sapiens modernos migrantes substituiram outras
espécies do gênero Homo já presentes fora do
continente africano, como Homo neanderthalensis e Homo denisova, porém, hoje se tem
conhecimento que ocorreu um certo grau hibridações entre Homo
sapiens e as outros hominínios "não-modernos"
dentro e fora da África, que faz com que os humanos viventes tenham uma pequena
porcentagem de material genético advindo
dessas outras espécies.
Atualmente, a hipótese mais
aceita é que o homem moderno saiu da África e colonizou outras partes do mundo,
em várias ondas migratórias,
corroborada por evidências fósseis, moleculares, microbiológicas.
Novas análises de sequências do cromossomo Y demonstraram
uma grande diversidade entre as linhas paternas no sul e sudeste da Ásia. Esta
evidência corrobora outro estudo feito anteriormente, em que, por meio de
análises feitas usando um dente de homem moderno, o
sudeste da Ásia foi identificado como um dos primeiros centros de dispersão
humana. Análises feitas no DNA mitocondrial apontaram
o sudoeste europeu como outro centro de dispersão secundária do homem moderno
há 40.000 anos. Dados moleculares e linguísticos indicam Beringia como
outro importante centro secundário de dispersão.
"Em um sentido genético,
todos nesse planeta se parecem africanos."
Original (em inglês): "In a genetic sense, everyone on this
planet looks like an African."
—
Svante Pääbo, Hoffecker, J. F. (2017). Modern humans: Their African origin
and global dispersal.
Humanos Modernos
Os Homo sapiens modernos
compartilham algumas características esqueléticas que podem ser identificadas
no registro fóssil, como neurocrânio alto
e arredondado, uma face pequena acomodada abaixo
dele e uma arcada supraciliar pequena
e dividida em duas partes essas delimitam o que é chamado Humano Anatomicamente
Moderno (no inglês Anatomically Modern Human, ou AMH), que inclui todos os
seres humanos hoje viventes. Esses traços surgiram e se estabeleceram entre 300
e 150 mil anos atrás na África (vide Tabela 1) e foram exportados para o
resto do mundo por expansões migratórias de
humanos que os continham, acontecendo com maior significância a partir de
aproximadamente 60 mil anos atrás. Em contraste, pode se chamar Homo
sapiens 'arcaico', ou humanos arcaicos, aqueles fósseis de hominídeos
que se encaixariam na linhagem humana direta entre a divergência a partir
de Homo heidelbergensis (nosso provável
ancestral comum com H. neanderthalensis e H. denisova) em aproximadamente 500 mil
anos atrás e
o estabelecimento dessas características diagnósticas de um humano moderno,
porém é recorrente o uso desse termo para se referir a outras espécies do
gênero Homo.
Além da caracterização anatômica dos seres humanos
modernos, há hipóteses que propõem que a evolução de Homo sapiens se
deu em duas etapas separadas, primeiramente com o estabelecimento gradual
dessas características morfológicas que são vistas no registro fóssil e,
posteriormente, após provavelmente 100 mil anos atrás, o desenvolvimento
do comportamento moderno
e faculdades cognitivas observadas
nos humanos viventes. Essa hipótese se apoia principalmente em evidências
arqueológicas que indicam um surgimento tardio de comportamentos simbólicos, em
relação ao surgimento da morfologia moderna Richard G. Klein integrou os
dados arqueológicos e fósseis e usou os dados para argumentar essa emergência
do comportamento moderno completo pode ser o que possibilitou a expansão humana
por todo o mundo, sendo essa chamada a "hipótese neural" da paleoantropologia. Também
há argumentos apontando que as evidências fósseis e arqueológicas indicam uma
evolução gradual tanto da morfologia, quanto da cognição humanas, essas
evidências foram sistematizadas em um artigo de alto impacto publicado por
McBrearty & Brooks em 2000.
Morfologia (Fósseis)
Características-chave de um
crânio humano moderno
As descrições operacionais
usada para definir humanos modernos osteologicamente visam
abranger o máximo de variação possível, porém elas sempre serão falhas e
poderão não englobar exceções, portanto é necessário ressaltar que todos os
seres humanos viventes estão inclusos na categoria de humanos anatomicamente
modernos, mesmo suas morfologias não estejam dentro dos parâmetros diagnósticos
usados na paleoantropologia.
Em linhas gerais o esqueleto
de um Humano Anatomicamente Moderno pode ser descrito formalmente por algumas
medidas métricas da morfologia do Crânio e Pós-crânio, propostas
inicialmente por Michael Day e Christopher Stringer no
Congresso Internacional de Paleontologia Humana de 1982, sediado em Nice.
Além disso, é possível se
distinguir os fósseis de Homo sapiens dos de outros hominínios
a partir do padrão de crescimento dos dentes, o qual está relacionado ao padrão
de desenvolvimento ontogenético retardado em H. sapiens,
que, por sua vez, está relacionado ao desenvolvimento das faculdades cognitivas características
dessa espécie. Porém, esse padrão já é observado mesmo em fósseis que ainda
apresentam um mosaico de características modernas e arcaicas, como os de 300
mil anos de Djebel Irhoud, no Marrocos.
Comportamento (Artefatos)
Como comportamentos não se
fossilizam, as melhores evidências que temos de sua evolução são os artefatos
gerados por eles, no caso de um comportamento humano considerado moderno e
associado à uma capacidade cognitiva equivalente à dos seres humanos viventes,
podendo esses artefatos estarem associados a características como exibição
social, trocas de longa distância, notações digitais (engraves) ou capacidades
artísticas.
Achados arqueológicos da Caverna Blombos datados
em aproximadamente 77 mil anos atrás, na África do Sul, se
destacam entre os artefatos que podem indicar um comportamento complexo, entre
eles estão conchas perfuradas, provavelmente usadas para confecção de colares e
outras ornamentações corporais, e um pedaço de ocre vermelho com
entalhes geométricos. Pontas ósseas farpadas encontradas em Catanda, Congo, e datadas em 90 mil anos
também são uma evidência do possível surgimento de um comportamento moderno.
Histórico da Hipótese
Até a década de 50 a paleoantropologia enfrentava
o problema da ausência de métodos precisos e confiáveis para se datar os
restos fósseis e até a década de 60 os registros fósseis de H. sapiens mais antigos pertenciam
a sítios na Europa ou na Ásia. Além disso, a paleoantropologia possuía fortes
vieses raciais, com uma visão de atraso da África em relação à Europa
Em 1967, foram descobertos,
por Richard Leakey e
sua equipe, restos fósseis humanos no que hoje é chamado de sítio Omo-Kibish,
no Rio Omo, Etiópia. O crânio fóssil
conhecido como Omo-Kibish I foi datado por Karl Butzer em cerca de 130 mil anos,
até então mais antigo que qualquer evidência prévia de humanos presentes em
qualquer outra região do mundo. Já durante os anos 70 e 80 mais restos
humanos foram encontrados e/ou datados, no leste e sul da África, em faixas
temporais que antecedem a presença de seres humanos modernos no resto do mundo,
incluindo os de Border Cave (África do Sul),
Florisbad (África do Sul), Eliye Springs (Quénia)
e Cavernas Rio Klassies (África
do Sul), vide Tabela 1.
A hipótese da Origem Recente
Africana só tomou corpo em meados dos anos 80, principalmente pelo trabalho dos
paleoantropólogos Günter Bräuer, na Alemanha, e Chris Stringer e Michael Day,
no Reino Unido; os quais, no Congresso Internacional de Paleontologia Humana de
1982, oficialmente apresentaram o modelo e argumentos para que os fósseis
encontrados no sul e no leste africano poderiam caracterizar membros de Homo
sapiens, na qual tembém proporam uma maneira sistemática de diagnosticar um
humano moderno através de traços anatômicos esqueléticos. A noção de uma
origem única na África surgiu como um contraste principalmente à hipótese
de Evolução Multirregional, que constituía o modelo
dominante para explicar o surgimento humano por todo o planeta.
A partir de 1987 o debate das
origens humanas entrou em uma nova instância, com a publicação de um trabalho
por Rebecca Cann,
Mark Stoneking e Alan Wilson, o
qual analisou sequências de DNA mitocondrial (mtDNA)
de 147 mulheres ao redor do mundo, reprensentando diferentes linhagens. O
trabalho apontou que todas a linhagens de fêmeas humana hoje viventes derivaram
de uma ancestral comum à aproximadamente 200 mil anos atrás. A partir
desse estudo se popularizaram termos como "Eva Mitocondrial" ou
"Eva Africana" para se referir a essa ancestral comum de todas as
mulheres humana viventes.
Desde a publicação dessa
primeira análise de mtDNA as análises genéticas passaram a dominar as pesquisas
na área, em sua maior parte corroborando o modelo ou fazendo adições a ele, com
a realização subsequente de análises de cromossomo Y, DNA ancestral (aDNA), e
mais recentemente análises genômicas de
populações e de material genético de microorganismos comensais ou
patogênicos que sofreram coevolução com
os humanos.
Até 2010, a discussão
sobre hibridação entre
humanos modernos e Neandertais se
baseava em traços anatômicos observados no registro fóssil e carecia de bases
sólidas, com o trabalho publicado em 2003 por Erik Trinkaus e
pares, que aprontava características Neandertais em um fóssil humano encontrado
em Oase, Romênia. Porém, em 2010 foram
publicados dois trabalhos independentes que, através de análises genéticas
genômicas possibilitadas pelo método de "Sequenciamento de Nova Geração",
apontavam a presença de cerca de 2,5% de DNA Neandertal nas populações Humana
não Africanas e aproximadamente 5% de DNA Denisovano em
populações nativas da Austrália e Nova Guiné. Essas publicações abriram
uma nova epoca no debate sobre as origens humanas, tirando a dominânancia da
hipótese de uma origem exclusivamente africana e deslocando o consenso para o
que pode se considerar o modelo "Origem Recente Africana +
Hibridação".
Evidências
A Origem Recente Africana, ou
RAO, do inglês Recent African Origin, e, posteriormente, a dispersão global dos
humanos modernos tem três pilares de evidências: a) dados fósseis de humanos modernos e
não-modernos, b) análise genética,
estudo do genoma de pessoas viventes atualmente, bem como dos fósseis
previamente mencionados, e c) dados arqueológicos -
artefatos, por exemplo, coletados em diferentes épocas e partes do mundo.
Evidências fósseis
Considerando que os fósseis
de Homo sapiens estão restritos apenas àqueles que
compartilham uma quantidade significativa de características semelhantes aos
humanos existentes nos dias de hoje, nossa espécie, os Homo sapiens,
tiveram origem no continente africano, há cerca de 200 mil anos, durante
o pleistoceno. Chamamos
os Homo sapiens de humanos anatomicamente modernos, isto é,
humanos que tinham características físicas semelhantes às que observamos nas
populações humanas atualmente. No entanto, há a denominação “anatomicamente
modernos” porque em algumas situações é difícil determinar como era o
comportamento, ou seja, quais eram as habilidades cognitivas e sociais daquele indivíduo ou
população. Os registros arqueológicos são muitos valiosos se tratando dessa
questão, e apresentaremos algumas contribuições da arqueologia mais abaixo.
Aqui, faremos um recorte dentro do vasto estudo paleológico, apresentando
fósseis que constituíram peças chave para o entendimento da história da
evolução humana.
Os Homo sapiens tiveram
origem a partir de uma longa linhagem de hominídeos, tendo como ancestral
imediato os Homo heidelbergensis, espécie que surgiu há cerca
de 0,7 milhões de anos. Na Europa e na Ásia, o Homo heidelbergensis também
originou os Neandertais e Denisovanos,
respectivamente. Dessa forma, o Homo heidelbergensis é nosso
ancestral comum com Neandertais e Denisovanos.
Apesar do surgimento dos
primeiros Homo sapiens modernos ser estimado em 200 mil anos
atrás, é difícil determinar o momento exato em que uma espécie surge. Assim, na
comunidade científica existem discussões acerca de como se deu - e quão rápido
foi - o surgimento do Homo sapiens anatomicamente moderno, a
partir dos humanos arcaicos. Uma forma de elucidar essa questão é através da
descoberta de fósseis com características intermediárias. Essa é a natureza dos
fósseis encontrados em Jebel Irhoud, Marrocos. Esses fósseis datam entre
300 e 350 mil anos de idade e fazem parte do grupo de fósseis mais antigos
do Homo sapiens moderno, tendo ainda características mais
antigas em relação à aparência dos humanos nos dias de hoje. Dessa forma, esses
fósseis marcam a transição de traços arcaicos - por exemplo, dentes maiores,
testa mais proeminente e menor cavidade cerebral - para as características
físicas atualmente observadas nos humanos.
Essas informações não implicam
no Homo sapiens ter surgido em Marrocos - em oposição aos
fósseis de Omo Kibish, na
Etiópia, até então os fósseis mais antigos encontrados de humanos modernos -
mas ilustra como o Homo sapiens teve, possivelmente, uma
origem pan-africana, ou
seja, que o processo evolutivo do Homo sapiens envolveu
diversas partes do continente africano. Por sua vez, os fósseis de Omo
Kibish, denominados Omo Kibish 1 e Omo Kibish 2, são fósseis datados como tendo
aproximadamente 200 mil anos e marcam o início do Homo sapiens anatomicamente
moderno, dado que a natureza dos fósseis de Jebel Irhoud segue sendo debatida.
Existe uma série de fósseis
datados de épocas posteriores aos fósseis mencionados acima. Seguindo a
cronologia da evolução humana, tudo indica que os humanos modernos surgiram na
África. Um estudo de 2018 sugere que o primeiro registro de humanos
anatomicamente modernos fora do continente africano esteja na região do Levante. Os sítios Es-Skhul e
Qafzeh, por muito tempo, foram conhecidos por abrigar os fósseis mais antigos
do Homo sapiens moderno fora do continente africano, datados de
90 a 125 mil anos. A hipótese defendia que os fósseis eram evidências das
primeiras tentativas de dispersão humana da África tropical para a região
temperada da Eurásia. Com estudos posteriores, foi possível compreender
que as migrações mais antigas podem ter resultado em extinção, por diversos
motivos, como possíveis competições e outras interações com espécies humanas já
extintas, por exemplo os Neandertais.
Descobertas mais recentes na
caverna Misliya, em Israel, indicam que essa primeira dispersão para fora da
África tenha acontecido há 180 mil anos, muito antes do que era esperado até
então. As evidências fósseis sugerem que os humanos modernos interagiram
com outras espécies de humanos já extintas, por exemplo os neandertais, por milhares
de anos. Contudo, as novas datações fósseis indicam, ainda, que podem ser
encontrados fósseis de humanos modernos ainda mais antigos no oeste asiático.
Descobertas em Daoxian e Zhirendong, na China, por exemplo, indicam ondas de
migração à Europa e Ásia mais antigas do que as descobertas no Levante, região
do Oriente Médio.
Muito embora a importância das
análises morfológicas em estudos de registros fósseis seja evidente para a
compreensão da origem e dispersão dos humanos, a paleoantropologia ainda
apresenta limitações e passa por mudanças que permitem aprimorar pesquisas e
descobertas na área. Desde 1950, os estudos desse ramo passaram por falta de
confiabilidade em métodos de datação de restos mortais, cronologicamente
organizados de acordo com as suposições de cada pesquisador. Outro obstáculo
está relacionado à falta de uma abordagem sistemática para a análise da
morfologia esquelética, bem como a seleção e medição subjetiva dos fósseis, que
ao longo da história se misturaram com questões de preconceito racial
generalizado na abordagem da evolução humana. Por último a qualidade de
preservação e a fragmentação das peças.
Por meio de novos métodos e
técnicas de estudo, a paleoantropologia está, aos poucos, passando por
reestruturações e revalidação de muitas evidências fósseis já estudadas. A
integração de várias disciplinas, principalmente com o auxílio de instrumentos
da biologia molecular permite construir filogenias com maior assertividade.
Ademais, o aprimoramento de datações radiométricas e
técnicas avançadas para análise dos fósseis contribui para maior confiabilidade
dos resultados encontrados.
Arqueologia
Artefatos, isto é, objetos ou indícios
de objetos que ajudam a relatar como as sociedades humanas viviam no passado,
são parte do registro arqueológico e
ajudam a entender como se deu a dispersão humana e quais foram suas
consequências. Artefatos também podem nos ajudar a compreender aspectos comportamentais. O
comportamento humano moderno é geralmente resumido em habilidades cognitivas e instrumentais sofisticadas,
organização social e pensamento simbólico.
Nosso ancestral comum com
o Homo neanderthalensis, o Homo heidelbergensis, já produzia ferramentas e armas considerados complexos,
na medida em que eram compostos por ao menos três componentes, como a confecção
de lanças. A criação de artefatos complexos é um indicativo de uma transição do
gênero Homo em relação à capacidade de manipular, armazenar e transmitir
informações. Acredita-se que os dados arqueológicos também fornecem
informações sobre intercâmbio cultural entre Neandertais e homens modernos. Um
exemplo seria a indústria châtelperroniana da Região da Cantábria. Nela foram
encontrados ferramentas de pedra caracteristicamente produzido por Neandertais
e outros artefatos diagnosticamente produzidos por homens modernos.
Novas categorias de artefatos
e informações não genéticas surgiram de forma gradual e sequencial com as
migrações do Homo sapiens, indicando possível padrão de
desenvolvimento e complexidade da cognição humana moderna. Entre elas estão os
ornamentos como objetos para exibição material, a arte visual como esculturas,
objetos com notações e instrumentos musicais que apresentam registros apenas
após 50.000 anos atrás. Já objetos utilizados para ornamento pessoal, por
exemplo conchas marinhas perfuradas, por exemplo, datam de 135.000 anos atrás
na região do Norte da África. Algumas hipóteses sugerem, entretanto, que alguns
desses objetos, em especial os de exibição social, sejam evolução de formas
anteriores construídas por hominínios primitivos.
Há 75 mil anos, quando os
humanos modernos já se dispersavam a partir da África para outros continentes,
os registros indicam que os humanos adquiriram a habilidade de pensamento
complexo. Assim, os artefatos encontrados que datam de 75 mil anos na África
apresentam complexidades associadas às características cognitivas dos humanos
modernos e complementam o estudo da anatomia dos fósseis encontrados para dar
força à hipótese de que os humanos modernos surgiram na África.
Entre os eventos mais
marcantes do desenvolvimento cognitivo do Homo sapiens estão o
surgimento repentino das artes visuais e
de notações simbólicas que não aparecem em outras espécies. A capacidade humana
de traduzir informações do cérebro em uma estrutura, a linguagem sintática e a artefatos complexos,
incluindo autômatos.
Outras formas de informação como a escrita e
a eletrônica parecem
ter surgido após a era glacial. Já
as pinturas e decorações corporais com desenhos feitos à base de pigmento
natural, carvão e argila têm datação de mais de 60.000 anos atrás.
Artefatos de maior complexidade
- por exemplo, armadilhas, armas de caça, objetos utilizados para costura ou
para cozinhar, objetos possivelmente simbólicos ou religiosos - em relação aos
objetos mais antigos feitos por hominídeos aparecem no registro arqueológico de
maneira que coincidem com as hipóteses de dispersão dos humanos modernos pela
África e para além do continente africano. A existência desses artefatos pode
ser registrada de maneira direta, ou seja, a presença de uma agulha indica que
aquela população de humanos costurava, ou indireta, como: a presença de ômega 3
nos fósseis humanos indica que a sociedade em que aquele indivíduo viveu tinha
algum tipo de tecnologia de pesca - varas de pesca, por exemplo. Exemplos de
artefatos complexos construídos por humanos modernos são as primeiras máquinas
de ação automática, os autômatos, como armadilhas feitas para capturar pequenos
mamíferos. Entre as primeiras evidências de autómatos, pode-se citar os restos
faunísticos da Caverna de Sibudu (KwaZulu-Natal), na África do Sul, datando de
cerca de 65.000 a 62.000 anos atrás, que sugere o possível uso de armadilhas.
Apesar de ajudar a compreender
a evolução da capacidade cognitiva e da dispersão do Homo sapiens,
a atribuição de muitos vestígios arqueológicos a humanos modernos ou não
modernos passa por incertezas em várias partes do mundo. Além disso, alguns
materiais utilizados para a fabricação de artefatos não são resistentes e se
deterioram ao longo do tempo. As raras evidências de artes visuais datadas de
75.000 anos atrás eram feitas de madeira, indicando que muito material pode ter
sido perdido.
Genética
O campo das evidências
genéticas vem se desenvolvendo à medida que se torna mais fácil analisar o DNA.
No século XXI, passaram a existir técnicas que tornam viável o sequenciamento do
DNA completo de um organismo. Assim, a quantidade de dados genéticos aumentou
muito, e agora as evidências genéticas compõem uma parte muito importante da
discussão sobre a origem dos humanos modernos.
DNA Mitocondrial
Não só o genoma do indivíduo é
importante ao inferir ancestralidade - uma das estratégias mais sólidas para
simulação de filogenias se concentra na análise
do DNA mitocondrial (mtDNA).
A mitocôndria tem
um trecho de bases nitrogenadas que
formam a estrutura do seu DNA circular - que não sofre recombinação -
e grande parte dessa sequência não participa no processo de síntese de proteínas. Por
não sofrer pressão seletiva,
portanto, está muito suscetível a acumular mutações,
ocasionadas por pequenos erros durante a duplicação do DNA que, por sua vez,
ocorre durante o processo de divisão celular. Por
conta de cada célula possuir muitas mitocôndrias, há grande abundância de DNA
mitocondrial em poucas porções de tecido.
Além disso, em humanos, mitocôndrias são transmitidas somente das mães para os
filhos - assim, inferências filogenéticas podem ter maior
resolução em menor espaço de tempo e se tornam mais confiáveis.
Em 1972 Richard Lewontin apontou
baixa variabilidade no mtDNA de mulheres
desde a dispersão global de humanos modernos. Por consequência da análise da
árvore filogenética construída a partir desses dados, concluíram que mulheres
modernas tiveram origem de uma ancestral que viveu há aproximadamente 200 mil
anos, na África. Na mídia da época, a
repercussão fez com que essa mulher fosse batizada de Eva Mitocondrial.
Cromossomo Y
Assim como o DNA mitocondrial,
o cromossomo Y (Y-DNA)
não sofre recombinação, mas
tem um número muito maior de pares de bases em
comparação com o exemplo anterior (aproximadamente 58 milhões; mDNA tem
aproximadamente 16500). É a contraposição às linhagens baseadas em mtDNA, pelo
cromossomo Y ser passado exclusivamente a homens. Um estudo recriou uma
filogenia que estima que a origem do ancestral africano masculino data de
apenas 59 mil anos, o que foi complementado com evidências fósseis da caverna
Feldhofer na Alemanha - onde encontraram o “Neandertal original”.
Genômica
As primeiras análises
genômicas com representação de toda população mundial renderam resultados que
já eram previstos pela hipótese da Origem Africana Recente, tendo sido
observada maior diversidade genética entre as populações africanas e uma
diversidade decrescente conforme se afasta da África ao longo das rotas de
migrações dos antepassados que fundaram as diferentes populações ao redor do
mundo (devido principal aos efeito de gargalo populacional e efeito fundador,
como previsto pela genética populacional). Os
africanos, encontrou 14 agrupamentos populacionais ancestrais que estão
fortemente correlacionados aos padrões geográficos, culturais e linguísticos
observados por toda a África.
Em 2016, três estudos
independentes publicados na revista Nature, utilizando
dados de indivíduos de mais de 270 localidades pelo mundo, obtidos através de
técnicas modernas de alta qualidade de sequenciamento de todo o genoma,
apontaram para a ocorrência de uma uma única grande dispersão a partir da
África, a partir da qual todos os não-africanos viventes derivaram de uma mesma
população ancestral advinda da África, com uma possível contribuição de uma
migração anterior à Oceania.
Outras evidências
Além de evidências genéticas,
fósseis e arqueológicas, existem outras evidências que sustentam a hipótese da
origem única. Estudos recentes demonstram que das três grandes famílias
de bactérias intestinais,
pelo menos duas delas coevoluiram com
a espécie humana há milhões de anos. Pesquisadores sugerem que esta relação
íntima entre o homem e a bactéria intestinal Helicobacter pylori data antes mesmo do
início das ondas migratórias do homem para o resto do mundo. Por conta
disso, na última década, através de análises moleculares do DNA da H.
pylori obtido de várias pessoas de lugares diferentes do mundo, foi
demonstrado que a diversidade genética deste microrganismo reflete a imigração
humana e, posteriormente, as separações geográficas e étnicas entre os grupos
humanos. Por exemplo, em um estudo realizado, pesquisadores compararam
sequências específicas do DNA de H. pylori extraídos de
hospedeiros das regiões de Connecticut e Malawi, foi descoberto que as cepas
bacterianas de Malawi divergiram da cepa americana há, pelo menos, 1.7 milhões
de anos, que corresponde, exatamente, à diáspora mais recente do homem saindo da
África. Isso ocorre porque as sequências de fragmentos de sete genes de
manutenção e um gene associado à virulência (vacA)
diferem de acordo com o continente de origem do hospedeiro, podendo, assim,
dividir a bactéria em sete populações e subpopulações com distribuições
geográficas diferentes entre si. Além disso, outros estudos sugerem que,
assim como ocorre com os humanos, a diversidade genética de H. pylori diminui
conforme aumenta a distância do Leste da África, o berço do homem moderno. E
a análise comparativa do DNA dos piolhos do corpo humano (Pediculus humanus),
que habitam as roupas, também revela uma origem africana recente (data de
dispersão estimada em cerca de 72.000 anos atrás).
Também, evidências linguísticas sugerem
que fonemas (unidades de som)
presentes nas línguas modernas exibe o mesmo padrão observado no DNA, ou seja,
a diversidade diminui em função do aumento da distância da África, sendo este
fenômeno explicado pelo efeito fundador, em
que sucessivos gargalos populacionais ocorridos durante a expansão seriam
responsáveis por reduzir a diversidade de forma progressiva.
Dados climatológicos também
são usados como evidências para a hipótese única, uma vez que dados fósseis e climatológicos
de oito milhões de anos atrás sugerem que alguns eventos ocorridos durante a
evolução da espécie humana, tais como, evolução de novas espécies, dispersão da
África para outros continentes, correspondem a períodos de mudanças climáticas
na África e Eurásia. Por exemplo, cerca de 38.000 a 36.000 anos atrás, houve um
período de calor intenso, responsável por uma explosão demográfica da espécie
humana na região norte da Eurásia.
Hibridação
Desde 2010 vem se acumulando
evidências de hibridação entre Homo sapiens e outras linhagens
hominínias, como H. neanderthalensis e H. denisova, através de estudos de
análise genômica,
que, pela quantidade muito maior de dados gerada, permite se acessar com maior
confiabilidade as relações filogenéticas entre as espécies,
reconstruindo os genomas das espécies hominínias extintas.
As espécies H.
neanderthalensis e H. denisova divergiram de H.
sapiens a partir de um ancestral comum (provavelmente representado
por H. heidelbergensis ou H. rhodesiensis) que
migrou da África a aproximadamente 500 mil anos atrás, dando origem aos
Neandertais na Europa e Denisovanos na Ásia. Quando os Homo sapiens modernos
se expandiram pelo mundo após 75 mil anos atrás encontraram esses outros
hominínios, o que resultou em eventos de hibridação entre essas espécies.
As análises genômicas mais
recentes apontam que todas as populações não-africanas possuem cerca de 2% de
ancestralidade Neandertal (possivelmente indicando um evento de hibridação
significativo pouco após a principal onda migratória para fora da
África). Através dos padrões de desequilíbrio de ligação genética Sriram
Sankararaman e pares estimaram a data de hibridação entre humanos e Neandertais
para aproximadamente 50–65 mil anos atrás. Porém outros trabalhos apontam
para um padrão mais complexo para essa mistura, com diferentes eventos de
hibridação em diferentes localidades e momentos, desde a chegada de H.
sapiens Eurasia, até a extinção dessas outras espécies de hominínios.
As tecnicas de sequenciamento
e análise de genomas também permitiram identificar introgressão de
material genético do outra espécie de hominínio, Homo denisova,
pouco após seu descobrimento a partir de um fragmento de osso do dedo
encontrado na Sibéria. Hoje se estima que populações nativas da Oceania
possuem entre 3-6% e populações do leste asiático 0,1-0,3% de
material genético possível de ser traçado aos Denisovanos.
Uma análise do genoma de 1523
indivíduos de diferentes regiões do mundo identificou que ocorreram ao menos 4
pulsos de fluxo genético entre H.
Sapiens e essas duas espécies: (1) um evento pouco após a saída dos
humanos modernos da África, contribuindo com uma pequena porcentagem do
material genético Neandertal em não-africanos; (2) posterior hibridação com
Neandertais contribuindo com a herança genética das populações viventes
européias, sul e leste asiáticas; (3) seguida por cruzamento entre asiáticos do
leste e Neandertais; e somente posteriormente tendo ocorrido uma hibridação com
Denisovanos que hoje é representada pela porção atribuível a Denisovanos que
populações nativas da Oceania (Melanésia e Austrália) carregam.
Outra linha de evidência para
a mistura entre humanos modernos e Neandertais está na análise genética
de microorganismos e
comparação entre as diferentes linhagens encontradas, como de uma
bactéria comensal da microbiota oral recuperada
do cálculo dental de
um fóssil Neandertal e do vírus sexualmente transmitido HPV 16.
Também foram identificadas, a
partir de análises do genoma de diversas populações africanas viventes, sinais
de hibridação limitada entre H. sapiens moderno e outros
representantes "arcaicos" do gênero Homo. Com evidências de uma
introgressão de aproximadamente 2% tão cedo quanto 35 mil anos atrás de uma
população que divergiu da linhagem humana há aproximadamente 700 mil anos
atrás.
Hoje o debate gira em torno de
qual é o grau dessa mistura entre H. sapiens e outras espécies do gênero Homo,
quanto isso teria influenciado o caminho evolutivo de nossa espécie e de que
forma isso se adequa aos diferentes modelos para a origem humana, sendo uma
posição bem balanceada face às novas evidências se apontar para um modelo que
mantém a Origem Africana Recente como principal contribuidora das
características humanas modernas e se adiciona o que pode ser chamado de
"Modelo da Origem Africana Recente + Hibridação" ou "Modelo
da Substituição com vazamento".
Fontes:
Wikipedia
Este texto é disponibilizado nos termos da
licença Atribuição-Não
Adaptada (CC BY-SA 3.0) da Creative Commons;
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