Pão
Chegamos a postar uma sinopse, mas foi solicitado
o estudo final completo!
Aqui a expressão varia. Não é mais "o pão
da Vida", mas "o Pão Vivo", ou seja: ho ártos ho zôn,
literalmente: "O PÃO, O QUE VIVE". Depois acrescenta: "é minha
carne" (hê sárx mou estin) expressão muito mais forte do que se
dissera "meu corpo" (sóma). Notemos a insistência de João
(aqui e nos versículos 52, 53, 54, 55 e 56) em frisar bem que Jesus possuía
realmente carne e sangue, e que, portanto, era um homem normal, e não apenas um
fantasma, com o corpo fluídico.
A preposição hupér, quando construída com o
genitivo, apresenta os significados usuais:
a)
- Sobre em cima de;
b)
- Por, ou para;
c)
- Em lugar de;
d)
- Por causa de;
e)
- A respeito de.
Ao transladá-la, neste trecho, para a Vulgata,
Jerônimo (que não dominava o Grego apenas sabia falar e ler sem conhecer a
gramatica) usou a preposição latina PRO, que aceita os significados 2, 3 e 4,
mas não o 1.º nem o 5.º. Temos, então, que limitar o sentido da frase a:
1 - a) PELA vida do mundo (em troca da ...);
2 - b) PARA a vida do mundo (para
vivificá-la);
3
- EM LUGAR DA vida do mundo (para
substituí-la);
4- POR CAUSA DA vida do mundo (para que
não morra).
Por todo o contexto da exposição, verificamos
que cabem melhor os sentidos 2 e 3: PELA, EM TROCA DA, EM LUGAR DA, EM
SUBSTITUIÇÃO A.
Preferimos "em lugar da" porque
apresenta maior clareza de sentido, sem perigo de ambiguidade.
Até o 53 é usado sistematicamente o verbo
defectivo phageín, sempre traduzido por "comer". Nos versículos
54, 56 e 57 é empregado trôgeín, que tem quase o mesmo sentido; alguma
razão deve haver para essa troca de sinônimos. Beber é pípein, e sangue,
haíma.
"Verdadeiramente", em ambas as
repetições, é alêthôs, advérbio, nos mss. aleph, D, delta,
theta e Vulgata; ao passo que B, C, L, T, e W têm "verdadeira"
(alêthês), adjetivo na forma feminina.
"Permanece" é o verbo ménei (cfr.
latim Manet). Veja a mesma afirmativa em João, 14:10,20 e João, 3:24 e
4:15-16.
O mesmo
adjetivo usado para qualificar o pão, no vers. 51, é empregado aqui para
qualificar o Pai: "o Pai Vivo" ou "que vive". "Eu vivo
através do Pai" (zô dià tòn patéra), em que "através de"
tem o sentido de “por meio de", melhor tradução do que simplesmente
"por" ou "pelo", que apresentaria ambiguidade de sentido,
podendo ser interpretado como "por causa do Pai". Ora, a preposição diá
significa basicamente "através de"; e só secundariamente
apresenta sentido causal.
Neste vers. há uma variação sinonímica entre
os verbos: primeiro é empregado éphagon (comeram), ao passo que depois é
usado trôgôn (saboreia). A expressão "para a imanência" tem,
no original:
eis tòn aiôna.
Assim como diante da Samaritana (a
alma "vigilante") foi dito "Eu sou a Água Viva", expondo o
primeiro passo do DESPERTAMENTO DO EU; e no trecho da cura da Hemorroíssa e da
ressurreição da filha de Jairo, foi alertado sobre a VIA PURGATIVA; e no trecho
que acabamos de comentar foi ensinada a VIA CONTEMPLATIVA, agora nos é revelada
a VIA UNITIVA, ou seja, o Cristo confirma que Deus habita em nós com Sua
Essência; e não apenas em nós, mas "em todas as coisas" (Cfr. . Tomás
de Aquino, Summa Theológica, I, q. 8, art. 1: Deus
est in ómnibus rebus ... et intime ... sicut agens adest ei in quod agit,
isto é: "Deus está em todas as coisas ... e intimamente ... como o agente
está naquilo em que age"). Vimos
que "a vontade do Pai" é que O encontremos. Agora, veremos que temos
que VIVER NELE, tal como Ele vive em nós, não apenas em perfeita união, mas em
unificação total.
Então prosseguimos no mesmo tom, que se eleva
cada vez mais, até chegar ao clímax, que faz que os imaturos (indecisos) se
afastem definitivamente. São dados os ensinos práticos de como obter essa
unificação.
Vejamos:
O novo passo é iniciado ainda com a
fórmula de garantia da veracidade: "Em verdade, em verdade vos digo".
Sempre é repetida como prólogo de uma lição importante, de uma verdade
fundamental.
Vem depois a afirmativa: "quem
confia em mim (no Cristo Cósmico, que continua com a palavra) tem a Vida eterna
(Imanente)". E então reafirma solenemente: "Eu sou o Pão da
Vida". A imagem do Pão é uma das mais felizes para ensinar a Via Unitiva.
Aparece depois uma comparação para
introduzir, com melhor compreensão, a temática que será desenvolvida. Começa,
pois, concedendo a veracidade da objeção formulada no vers. 31: "Vossos
pais comeram o pão no deserto". Observemos que, se fora a personalidade de
Jesus que falasse, teria dito: "nossos pais"; mas sendo o Cristo, não
tem filiação humana, não tendo nascido "do sangue, nem da vontade da
carne, nem da vontade do homem, mas de Deus" ( “..., eles que não foram
gerados nem do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade do
homem, mas de Deus” João, 1:13.).
Vamos observar ainda que diz apenas
"pão", e não como fora enunciado pelos objetantes: "pão vindo do
céu". Concedida, em princípio, a objeção apresentada, é lhe oposta, de
imediato e contradita decepcionante:
"mas morreram" ... A contra
argumentação é categórica, verdade irrespondível que não admite réplica.
E logo em contraposição do pão que não
evita a morte, é apresentado aos discípulos o outro pão espiritual que, uma vez
ingerido, lhe comunica, vida que não admite morte. O que mais assusta os
circunstantes é que Jesus, após apresentar-se como sendo Ele o Pão que desce do
céu, diz que se alguém comer desse pão não morrerá. Não tendo conhecimento de
que era o Cristo que falava, julgavam ser a personalidade de Jesus que se
propunha dar-se como alimento. Daí o “quiproquó”
terrível que os desorienta, que se agrava cada vez mais, e que o Cristo não
se preocupa em desfazer.
Ao contrário: vai dando Sua lição
superior, sem cuidar dos imaturos.
Fala o Cristo. "Eu sou o PÃO VIVO
que desci do céu". Já não diz mais "o Pão da Vida", mas muito mais
explicitamente, definindo Sua natureza: "o PÃO, O QUE VIVE" (ho
ártos, ho zôn, com a mesma fórmula usada no vers. 57 “o PAI, 0 QUE VIVE, ho
pátêr, ho zôn”.).
É a repetição do mesmo conceito em
outros termos mais precisos e profundos, numa didática perfeita, em que cada
repetição acrescenta um pormenor, por vezes mínimo, mas trazendo sempre maior
elucidação. E repisa: "se alguém comer deste Pão (que é Ele!) viverá para
a imanência".
Como poderia dar-se isso? Não dando
tempo nem para pensar, vem a frase chocante: "e mais, o Pão que eu darei é
MINHA CARNE" ... e esclarece "em lugar da vida do mundo"! O
ensino chegou à revelação total da Verdade que constituía nosso objetivo.
Compreendamos bem o texto: para todos os que ainda vivem na personalidade, o eu
é constituído por seu próprio corpo físico denso; então a substância deles,
para eles, é a carne deles. Nesse sentido, diz o Cristo que o Pão é Sua Carne,"
isto é, Sua Substância; pois a substância do Cristo Cósmico é a substância
última de todas as coisas, apenas numa vibração mais baixa, ou seja; na
condensação da energia.
Exatamente esse pensamento é repetido
por Agostinho que, em suas meditações, confessa ter percebido essa mesma voz do
Cristo Interno: tamquam audírem vocem tuam de excelso:
cibus sum gradium; cresce et manducabis me Nec tu me in te mutabis
sicut cibum carnis tuae, sed tu mutáberis in me (Confiss. 7, 10, 16) ou
seja: "como se eu ouvisse uma voz do alto: sou o alimento dos evoluídos;
cresce e me comerás. E tu não me transformarás em ti como alimento de tua
carne, mas tu te transformarás em mim". A característica das criaturas
geniais é dizerem bem e dizerem muito em poucas palavras.
Nessa frase de Agostinho está
perfeitamente revelada a Cristificação da criatura, que se infinitisa, se
eterniza? Se deifica em contato com a Substância Divina, que está em todos e em
cada um, pela unificação com o Cristo Interno, que é o Eu Profundo e
verdadeiro, a Centelha Divina.
Tomás de Aquino explica o modo por que
está em nós a essência de Deus (cfr. Summa Theol. I, q. 8, art. 3, ad primum,
citado acima). Quanto à segunda parte da frase de Agostinho, é ela elucidada
por
Tomás de Aquino, que escreve:
“Spiritualia cóntínent ea in quibus sunt, sicut ánima cóntinet corpus”.
Unde et Deus est in rebus sicut cóntinens res.
Támen, secundurn quamdam similitudinem corporalium,
dicuntur omnia esse in Deo, in quanturn
continentur ab ipso (Sum. Theol. I, q. 8. art. I, ad 2 um), que significa:
"as coisas espirituais contêm as coisas em que estão, como a alma contém o
corpo. Donde também Deus está nas coisas corno contendo as coisas. Contudo, por
uma espécie de semelhança com as coisas materiais, diz-se que todas as coisas
estão em Deus, já que são contidas por Ele".
Em Sua lição, de que é o Pão Vivo o
Cristo não quer deixar a menor dúvida de que o Pão de que Ele fala é "Sua
CARNE", ou seja, Sua Substância aquela mesma substância divina que Ele nos
dá na Vida Imanente, para substituir a vida do mundo, ou seja, em lugar da vida
pequenina e transitória da personalidade.
Claro que nada disso foi compreendido
pelos ouvintes, embora encontremos em Strack-Billerbeck que alguns deveriam ter
entendido "comer e beber" como aplicados ao estudo da lei mosaica.
Surgem então as discussões com os que entenderam que tudo devia ser interpretado
literalmente. Vem a pergunta: "Como dará Ele de comer sua própria
carne"? A hipótese antropofágica foi rejeitada como absurda e inaceitável.
Diante de tal incompreensão, o Cristo
nem procura explicar. Nem uma palavra é proferida em resposta à indagação angustiosa.
De nada adianta perder tempo esclarecendo criaturas que não alcançam sequer a
metáfora e o simbolismo, quanto mais o sentido profundo. E sabendo o Cristo que
mesmo com alterações sua mensagem é para a humanidade em todos os tempos.
Então o Cristo resolve romper todas as
barreiras e repetir Seu ensinamento, martelando na mesma tecla e acrescentando
um pormenor “horripilante” para os israelitas: "Se não comeis a carne do
Filho do Homem, e não bebeis seu sangue, não tendes a Vida em vós"! Ora,
era terminante e severamente proibido "comer o sangue" dos animais,
mesmo cozinhado (cfr. Gên. 9:4 e Deut. 12:16), porque aí mesmo se esclarece que
"o sangue é a alma do ser vivente". Muito pior seria, portanto, a
hipótese de beber o sangue cru, ainda quente, e não de um animal, mas de um ser
humano ...
Mas era exatamente isso que o Cristo
ensinava e ensina-nos ainda: para ter a Vida Imanente é indispensável COMER
(assimilar a si) a carne (a substância viva) do Cristo Interno que é nossa
vida; e além disso, BEBER (aspirar em si por sintonia vibratória perfeita) o
Seu sangue (a alma, a parte mais espiritual Dele). De fato, é assim: só nos
unificaremos ao Eu Profundo no Esponsalício Místico, quando assimilarmos a nós
a Substância e o Espírito do Cristo de Deus, que em nosso coração habita com
toda a plenitude da Divindade.
E diante de um movimento de horror
escandalizado, o Cristo repisa, já então mudando o verbo, para causar maior
repulsa nos imaturos e mais apurado amor nos evoluídos: “quem me saboreia a
carne e me bebe o sangue tem a Vida Imanente, e eu o elevarei na etapa final”.
Só depois que o Espírito consegue essa unificação mística, mas REAL, é que
poderá atingir a etapa final da evolução. Sem o Encontro no
"mergulho", sem a unificação com o Cristo Interno dentro de nós, não
obteremos o "reino dos céus", não atingiremos a etapa final! ("o
último dia") de nossa subida para o Alto.
“Paulo já dizia “não sou mais eu que
vivo, o Cristo é que vive em mim" (Gal. 2:20).”.
E a razão disso é dada:
"Porque minha carne é
verdadeiramente alimento e meu sangue é verdadeiramente bebida". Não são
apenas símbolos: são realidades, embora não físicas e materiais, mas
espirituais, porque todas as palavras do Cristo são Espírito e são Vida"
(vers. 63 – “O espírito é que vivifica; a carne para nada serve. As palavras
que vos disse são espírito e vida”). Com efeito, nosso Eu Real não é
constituído da carne do corpo físico denso, nem do sangue que circula em nossas
veias: nosso EU REAL é constituído da substância mais íntima (a carne) e da
vibração mais pura (o sangue) do Filho do Homem, do Cristo Interno, do Amado
Divino. Então, essa essência de Deus em nós é que constitui o verdadeiro
alimento e a verdadeira bebida da Vida Imanente.
E aqui chegamos ao ponto mais sublime do
ensino sobre a Via Unitiva; temos a revelação plena da unificação com o Cristo;
após mais uma repetição didática, para que não haja ambiguidade: "quem me
saboreia (longamente, no mergulho interno) a carne e me bebe (a largos haustos,
na oração) o sangue, PERMANECE EM MIM E EU NELE"! ...
Esse maravilhoso ensino será ainda
repetido pelo Cristo em João, 14:10-20; 15:4-5; João, 4:15-16. Trata-se da
unificação total, mútua, perfeita: vivemos na plenitude do Cristo e o Cristo
vive em nós, como dizia Paulo: "não sou mais eu que vivo, o Cristo é que
vive em mim" (Gal. 2:20).
Como não entender que toda essa magnífica e
elevadíssima lição não se prende apenas a um simples ato externo da ingestão de
uma hóstia de trigo? Seu sentido é muito mais profundo, mais belo, mais
verdadeiro e mais sublime! Por que limitar um ensino de tal excelsitude a um
pequeno e rápido rito exterior? Compreendamos o alcance maravilhoso da Palavra
do Cristo em toda sua profundidade viva e real. Nenhum Avatar, nenhum místico,
em qualquer época ou país, atingiu níveis tão elevados e sublimes de ensino.
Neste versículo volta o Mestre a
insistir na união do Amado ao Amante: "assim como o Pai (o Verbo, o Som
Criador) que vive, que é a Vida porque é Deus em Seu segundo aspecto, enviou a
mim, o Cristo (o Amado), e eu, o Cristo, vivo por meio do Pai (através do Pai),
assim quem me saboreia também viverá por meio de mim (através de mim)".
É perfeita a simbiose entre o Amante
(Pai) e o Amado (Filho), e um vive pelo outro dentro do Amor (o Espírito Santo),
que é o Absoluto, a Luz Incriada, o Sem Nome. Só quem saboreia o Cristo no
mergulho, poderá viver através do Cristo, tal como o Cristo vive através do Pai
que O enviou à matéria, na qualidade de Centelha Divina, para dar Vida ao
mundo.
E como arremate da lição, volta às
palavras iniciais, repetindo a tese que foi exuberante e exaustivamente
provada: este é o pão que desce do céu e "que não é como o pão que comeram
vossos pais e morreram: quem come este pão, viverá sempre na imanência".
Maravilhosa e sublime lição, que
atinge as maiores altitudes místicas capazes de serem compreendidas no estágio
hominal em que nos achamos!
Depois da aula virá uma explicação de
grande importância reservada aos discípulos. “a revelação do Paraclito”
Quem defende, guia e protege outra pessoa; intercessor,
mentor, consolador; paraclito, paracleto.
O consolador prometido por Jesus e
trazido e codificado em 1857
“Tenho ainda muito que vos dizer, mas
não podeis agora suportar. Quando vier o Espírito da verdade ele vos guiará na
verdade plena (na verdade inteira), pois não falará de si mesmo, mas dirá tudo
o tiver ouvido e vos anunciará as coisas futuras”.
“E a Doutrina Espírita é o consolador
prometido trazido pelo Espírito da Verdade onde revela tudo o que se precisa
saber quando a “de onde vens, para onde vais e o que está fazendo aqui” além de
repetir tudo o que Jesus já disse”.
Fontes:
Evangelho de João
Bíblia de
Jerusalém
Novo Testamento
C.E.I.
Confissões de
Santo Agostinho
Epístolas de
Paulo
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