sábado, 17 de abril de 2021

PÃO

 

Pão

Chegamos a postar uma sinopse, mas foi solicitado o estudo final completo!

Aqui a expressão varia. Não é mais "o pão da Vida", mas "o Pão Vivo", ou seja: ho ártos ho zôn, literalmente: "O PÃO, O QUE VIVE". Depois acrescenta: "é minha carne" (hê sárx mou estin) expressão muito mais forte do que se dissera "meu corpo" (sóma). Notemos a insistência de João (aqui e nos versículos 52, 53, 54, 55 e 56) em frisar bem que Jesus possuía realmente carne e sangue, e que, portanto, era um homem normal, e não apenas um fantasma, com o corpo fluídico.

A preposição hupér, quando construída com o genitivo, apresenta os significados usuais:

a)     - Sobre em cima de;

b)     - Por, ou para;

c)     - Em lugar de;

d)     - Por causa de;

e)     - A respeito de.

Ao transladá-la, neste trecho, para a Vulgata, Jerônimo (que não dominava o Grego apenas sabia falar e ler sem conhecer a gramatica) usou a preposição latina PRO, que aceita os significados 2, 3 e 4, mas não o 1.º nem o 5.º. Temos, então, que limitar o sentido da frase a:

1 - a) PELA vida do mundo (em troca da ...);

2 - b) PARA a vida do mundo (para vivificá-la);

3        - EM LUGAR DA vida do mundo (para substituí-la);

     4- POR CAUSA DA vida do mundo (para que não morra).

Por todo o contexto da exposição, verificamos que cabem melhor os sentidos 2 e 3: PELA, EM TROCA DA, EM LUGAR DA, EM SUBSTITUIÇÃO A.

Preferimos "em lugar da" porque apresenta maior clareza de sentido, sem perigo de ambiguidade.

Até o 53 é usado sistematicamente o verbo defectivo phageín, sempre traduzido por "comer". Nos versículos 54, 56 e 57 é empregado trôgeín, que tem quase o mesmo sentido; alguma razão deve haver para essa troca de sinônimos. Beber é pípein, e sangue, haíma.

"Verdadeiramente", em ambas as repetições, é alêthôs, advérbio, nos mss. aleph, D, delta, theta e Vulgata; ao passo que B, C, L, T, e W têm "verdadeira" (alêthês), adjetivo na forma feminina.

"Permanece" é o verbo ménei (cfr. latim Manet). Veja a mesma afirmativa em João, 14:10,20 e João, 3:24 e 4:15-16.

 O mesmo adjetivo usado para qualificar o pão, no vers. 51, é empregado aqui para qualificar o Pai: "o Pai Vivo" ou "que vive". "Eu vivo através do Pai" (zô dià tòn patéra), em que "através de" tem o sentido de “por meio de", melhor tradução do que simplesmente "por" ou "pelo", que apresentaria ambiguidade de sentido, podendo ser interpretado como "por causa do Pai". Ora, a preposição diá significa basicamente "através de"; e só secundariamente apresenta sentido causal.

Neste vers. há uma variação sinonímica entre os verbos: primeiro é empregado éphagon (comeram), ao passo que depois é usado trôgôn (saboreia). A expressão "para a imanência" tem, no original:

eis tòn aiôna.

Assim como diante da Samaritana (a alma "vigilante") foi dito "Eu sou a Água Viva", expondo o primeiro passo do DESPERTAMENTO DO EU; e no trecho da cura da Hemorroíssa e da ressurreição da filha de Jairo, foi alertado sobre a VIA PURGATIVA; e no trecho que acabamos de comentar foi ensinada a VIA CONTEMPLATIVA, agora nos é revelada a VIA UNITIVA, ou seja, o Cristo confirma que Deus habita em nós com Sua Essência; e não apenas em nós, mas "em todas as coisas" (Cfr. . Tomás de Aquino, Summa Theológica, I, q. 8, art. 1: Deus est in ómnibus rebus ... et intime ... sicut agens adest ei in quod agit, isto é: "Deus está em todas as coisas ... e intimamente ... como o agente está naquilo em que age").  Vimos que "a vontade do Pai" é que O encontremos. Agora, veremos que temos que VIVER NELE, tal como Ele vive em nós, não apenas em perfeita união, mas em unificação total.

Então prosseguimos no mesmo tom, que se eleva cada vez mais, até chegar ao clímax, que faz que os imaturos (indecisos) se afastem definitivamente. São dados os ensinos práticos de como obter essa unificação.

Vejamos:

O novo passo é iniciado ainda com a fórmula de garantia da veracidade: "Em verdade, em verdade vos digo". Sempre é repetida como prólogo de uma lição importante, de uma verdade fundamental.

Vem depois a afirmativa: "quem confia em mim (no Cristo Cósmico, que continua com a palavra) tem a Vida eterna (Imanente)". E então reafirma solenemente: "Eu sou o Pão da Vida". A imagem do Pão é uma das mais felizes para ensinar a Via Unitiva.

Aparece depois uma comparação para introduzir, com melhor compreensão, a temática que será desenvolvida. Começa, pois, concedendo a veracidade da objeção formulada no vers. 31: "Vossos pais comeram o pão no deserto". Observemos que, se fora a personalidade de Jesus que falasse, teria dito: "nossos pais"; mas sendo o Cristo, não tem filiação humana, não tendo nascido "do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus" ( “..., eles que não foram gerados nem do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade do homem, mas de Deus” João, 1:13.).

Vamos observar ainda que diz apenas "pão", e não como fora enunciado pelos objetantes: "pão vindo do céu". Concedida, em princípio, a objeção apresentada, é lhe oposta, de imediato e contradita decepcionante:

"mas morreram" ... A contra argumentação é categórica, verdade irrespondível que não admite réplica.

E logo em contraposição do pão que não evita a morte, é apresentado aos discípulos o outro pão espiritual que, uma vez ingerido, lhe comunica, vida que não admite morte. O que mais assusta os circunstantes é que Jesus, após apresentar-se como sendo Ele o Pão que desce do céu, diz que se alguém comer desse pão não morrerá. Não tendo conhecimento de que era o Cristo que falava, julgavam ser a personalidade de Jesus que se propunha dar-se como alimento. Daí o “quiproquó” terrível que os desorienta, que se agrava cada vez mais, e que o Cristo não se preocupa em desfazer.

Ao contrário: vai dando Sua lição superior, sem cuidar dos imaturos.

Fala o Cristo. "Eu sou o PÃO VIVO que desci do céu". Já não diz mais "o Pão da Vida", mas muito mais explicitamente, definindo Sua natureza: "o PÃO, O QUE VIVE" (ho ártos, ho zôn, com a mesma fórmula usada no vers. 57 “o PAI, 0 QUE VIVE, ho pátêr, ho zôn”.).

É a repetição do mesmo conceito em outros termos mais precisos e profundos, numa didática perfeita, em que cada repetição acrescenta um pormenor, por vezes mínimo, mas trazendo sempre maior elucidação. E repisa: "se alguém comer deste Pão (que é Ele!) viverá para a imanência".

Como poderia dar-se isso? Não dando tempo nem para pensar, vem a frase chocante: "e mais, o Pão que eu darei é MINHA CARNE" ... e esclarece "em lugar da vida do mundo"! O ensino chegou à revelação total da Verdade que constituía nosso objetivo. Compreendamos bem o texto: para todos os que ainda vivem na personalidade, o eu é constituído por seu próprio corpo físico denso; então a substância deles, para eles, é a carne deles. Nesse sentido, diz o Cristo que o Pão é Sua Carne," isto é, Sua Substância; pois a substância do Cristo Cósmico é a substância última de todas as coisas, apenas numa vibração mais baixa, ou seja; na condensação da energia.

Exatamente esse pensamento é repetido por Agostinho que, em suas meditações, confessa ter percebido essa mesma voz do Cristo Interno: tamquam audírem vocem tuam de excelso: cibus sum gradium; cresce et manducabis me Nec tu me in te mutabis sicut cibum carnis tuae, sed tu mutáberis in me (Confiss. 7, 10, 16) ou seja: "como se eu ouvisse uma voz do alto: sou o alimento dos evoluídos; cresce e me comerás. E tu não me transformarás em ti como alimento de tua carne, mas tu te transformarás em mim". A característica das criaturas geniais é dizerem bem e dizerem muito em poucas palavras.

Nessa frase de Agostinho está perfeitamente revelada a Cristificação da criatura, que se infinitisa, se eterniza? Se deifica em contato com a Substância Divina, que está em todos e em cada um, pela unificação com o Cristo Interno, que é o Eu Profundo e verdadeiro, a Centelha Divina.

Tomás de Aquino explica o modo por que está em nós a essência de Deus (cfr. Summa Theol. I, q. 8, art. 3, ad primum, citado acima). Quanto à segunda parte da frase de Agostinho, é ela elucidada por

Tomás de Aquino, que escreve: “Spiritualia cóntínent ea in quibus sunt, sicut ánima cóntinet corpus”.

Unde et Deus est in rebus sicut cóntinens res. Támen, secundurn quamdam similitudinem corporalium,

dicuntur omnia esse in Deo, in quanturn continentur ab ipso (Sum. Theol. I, q. 8. art. I, ad 2 um), que significa: "as coisas espirituais contêm as coisas em que estão, como a alma contém o corpo. Donde também Deus está nas coisas corno contendo as coisas. Contudo, por uma espécie de semelhança com as coisas materiais, diz-se que todas as coisas estão em Deus, já que são contidas por Ele".

Em Sua lição, de que é o Pão Vivo o Cristo não quer deixar a menor dúvida de que o Pão de que Ele fala é "Sua CARNE", ou seja, Sua Substância aquela mesma substância divina que Ele nos dá na Vida Imanente, para substituir a vida do mundo, ou seja, em lugar da vida pequenina e transitória da personalidade.

Claro que nada disso foi compreendido pelos ouvintes, embora encontremos em Strack-Billerbeck que alguns deveriam ter entendido "comer e beber" como aplicados ao estudo da lei mosaica. Surgem então as discussões com os que entenderam que tudo devia ser interpretado literalmente. Vem a pergunta: "Como dará Ele de comer sua própria carne"? A hipótese antropofágica foi rejeitada como absurda e inaceitável.

Diante de tal incompreensão, o Cristo nem procura explicar. Nem uma palavra é proferida em resposta à indagação angustiosa. De nada adianta perder tempo esclarecendo criaturas que não alcançam sequer a metáfora e o simbolismo, quanto mais o sentido profundo. E sabendo o Cristo que mesmo com alterações sua mensagem é para a humanidade em todos os tempos.

Então o Cristo resolve romper todas as barreiras e repetir Seu ensinamento, martelando na mesma tecla e acrescentando um pormenor “horripilante” para os israelitas: "Se não comeis a carne do Filho do Homem, e não bebeis seu sangue, não tendes a Vida em vós"! Ora, era terminante e severamente proibido "comer o sangue" dos animais, mesmo cozinhado (cfr. Gên. 9:4 e Deut. 12:16), porque aí mesmo se esclarece que "o sangue é a alma do ser vivente". Muito pior seria, portanto, a hipótese de beber o sangue cru, ainda quente, e não de um animal, mas de um ser humano ...

Mas era exatamente isso que o Cristo ensinava e ensina-nos ainda: para ter a Vida Imanente é indispensável COMER (assimilar a si) a carne (a substância viva) do Cristo Interno que é nossa vida; e além disso, BEBER (aspirar em si por sintonia vibratória perfeita) o Seu sangue (a alma, a parte mais espiritual Dele). De fato, é assim: só nos unificaremos ao Eu Profundo no Esponsalício Místico, quando assimilarmos a nós a Substância e o Espírito do Cristo de Deus, que em nosso coração habita com toda a plenitude da Divindade.

E diante de um movimento de horror escandalizado, o Cristo repisa, já então mudando o verbo, para causar maior repulsa nos imaturos e mais apurado amor nos evoluídos: “quem me saboreia a carne e me bebe o sangue tem a Vida Imanente, e eu o elevarei na etapa final”. Só depois que o Espírito consegue essa unificação mística, mas REAL, é que poderá atingir a etapa final da evolução. Sem o Encontro no "mergulho", sem a unificação com o Cristo Interno dentro de nós, não obteremos o "reino dos céus", não atingiremos a etapa final! ("o último dia") de nossa subida para o Alto.

“Paulo já dizia “não sou mais eu que vivo, o Cristo é que vive em mim" (Gal. 2:20).”.

E a razão disso é dada:

"Porque minha carne é verdadeiramente alimento e meu sangue é verdadeiramente bebida". Não são apenas símbolos: são realidades, embora não físicas e materiais, mas espirituais, porque todas as palavras do Cristo são Espírito e são Vida" (vers. 63 – “O espírito é que vivifica; a carne para nada serve. As palavras que vos disse são espírito e vida”). Com efeito, nosso Eu Real não é constituído da carne do corpo físico denso, nem do sangue que circula em nossas veias: nosso EU REAL é constituído da substância mais íntima (a carne) e da vibração mais pura (o sangue) do Filho do Homem, do Cristo Interno, do Amado Divino. Então, essa essência de Deus em nós é que constitui o verdadeiro alimento e a verdadeira bebida da Vida Imanente.

E aqui chegamos ao ponto mais sublime do ensino sobre a Via Unitiva; temos a revelação plena da unificação com o Cristo; após mais uma repetição didática, para que não haja ambiguidade: "quem me saboreia (longamente, no mergulho interno) a carne e me bebe (a largos haustos, na oração) o sangue, PERMANECE EM MIM E EU NELE"! ...

Esse maravilhoso ensino será ainda repetido pelo Cristo em João, 14:10-20; 15:4-5; João, 4:15-16. Trata-se da unificação total, mútua, perfeita: vivemos na plenitude do Cristo e o Cristo vive em nós, como dizia Paulo: "não sou mais eu que vivo, o Cristo é que vive em mim" (Gal. 2:20).

Como não entender que toda essa magnífica e elevadíssima lição não se prende apenas a um simples ato externo da ingestão de uma hóstia de trigo? Seu sentido é muito mais profundo, mais belo, mais verdadeiro e mais sublime! Por que limitar um ensino de tal excelsitude a um pequeno e rápido rito exterior? Compreendamos o alcance maravilhoso da Palavra do Cristo em toda sua profundidade viva e real. Nenhum Avatar, nenhum místico, em qualquer época ou país, atingiu níveis tão elevados e sublimes de ensino.

Neste versículo volta o Mestre a insistir na união do Amado ao Amante: "assim como o Pai (o Verbo, o Som Criador) que vive, que é a Vida porque é Deus em Seu segundo aspecto, enviou a mim, o Cristo (o Amado), e eu, o Cristo, vivo por meio do Pai (através do Pai), assim quem me saboreia também viverá por meio de mim (através de mim)".

É perfeita a simbiose entre o Amante (Pai) e o Amado (Filho), e um vive pelo outro dentro do Amor (o Espírito Santo), que é o Absoluto, a Luz Incriada, o Sem Nome. Só quem saboreia o Cristo no mergulho, poderá viver através do Cristo, tal como o Cristo vive através do Pai que O enviou à matéria, na qualidade de Centelha Divina, para dar Vida ao mundo.

E como arremate da lição, volta às palavras iniciais, repetindo a tese que foi exuberante e exaustivamente provada: este é o pão que desce do céu e "que não é como o pão que comeram vossos pais e morreram: quem come este pão, viverá sempre na imanência".

Maravilhosa e sublime lição, que atinge as maiores altitudes místicas capazes de serem compreendidas no estágio hominal em que nos achamos!

Depois da aula virá uma explicação de grande importância reservada aos discípulos. “a revelação do Paraclito”

Quem defende, guia e protege outra pessoa; intercessor, mentor, consolador; paraclito, paracleto.

O consolador prometido por Jesus e trazido e codificado em 1857

“Tenho ainda muito que vos dizer, mas não podeis agora suportar. Quando vier o Espírito da verdade ele vos guiará na verdade plena (na verdade inteira), pois não falará de si mesmo, mas dirá tudo o tiver ouvido e vos anunciará as coisas futuras”.

“E a Doutrina Espírita é o consolador prometido trazido pelo Espírito da Verdade onde revela tudo o que se precisa saber quando a “de onde vens, para onde vais e o que está fazendo aqui” além de repetir tudo o que Jesus já disse”.

Fontes:

Evangelho de João

Bíblia de Jerusalém

Novo Testamento C.E.I.

Confissões de Santo Agostinho

Epístolas de Paulo

 

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