“O CRISTIANISMO DO CRISTO
E O DOS SEUS VIGÁRIOS...”
"A Igreja romana não relegou para segundo
plano o pai, fazendo do filho o objeto exclusivo de seu culto de adoração? E o
culto prestado a Maria já não ameaça substituir o que ela, a Igreja, presta ao
filho? "Mas virá o tempo, e já veio, em que os verdadeiros adoradores
adorarão o pai em ESPÍRITO E VERDADE; esses são os adoradores que o pai quer.
" "Os Quatro Evangelhos" de J.-B. Roustaing, à pág. 221 - Vol 4
- 7ª Ed. (FEB) 1990.
A curiosidade levou a maiores
conhecimentos mesmo que superficiais do Padre Alta, que mesmo doutor da Sorbonne
abraçou a Doutrina Espírita. Como o livro é extenso transcrevemos apenas dois
trechos da sua lógica inconformista com o clero.
CONCLUSÃO
A progressão maravilhosa do número
dos cristãos, quando o Cristianismo ainda se encontrava na sua simplicidade
nativa, e as necessidades de organização disciplinar que daí resultaram desde o
começo do segundo século, rapidamente fizeram surgir a atribuição de uma
autoridade predominante a um bispo único em cada "igreja", isto é, em
cada "fraternidade de eleitos", por pouco importante que fosse.
Mais tarde, logo após a conversão (!!!
há quem afirme que morreu pagão apesar de seu decreto) de Constantino, a
adaptação às condições geográficas e administrativas do organismo romano criou
logicamente uma hierarquia entre os bispos de uma mesma provinda e, os fez
dependentes todos do titular episcopal do principal centro da província.
Depois, o orgulho de dominação e as pretensões de inteligência que, entre os
Gregos, ainda mais sutis do que os rabinos judeus, imediatamente suscitaram
insensatas disputas teológicas, forçaram os imperadores a convocar os bispos
para se reunirem em concílios e, até, com o intento de fazer que cessassem as
disputas, e declarar obrigatórias, para todos os seus súditos, as definições
metafisicas adotadas por maioria de votos.
Mais tarde, no Ocidente, para
resistir aos ataques dos bárbaros e reorganizar o que aquelas disputas incessantemente
desagregavam, a necessidade que se fez sentir progressivamente de centralizar o
episcopado reduzido a frangalhos e Roma estava logicamente indicada para centro
natural dessa unificação reparadora.
Desde então, os papas romanos,
admiravelmente servidos pelas ordens monásticas, organizaram uma hierarquia e
uma dependência administrativas, depois um ensino histórico e uma ortodoxia
teológica que, finalmente, por um último concilio reunido em Roma no ano
de 1870, deferiram a Pio IX e aos seus sucessores a infalibilidade doutrinária
e a autoridade total (o que Roma dita é verdade absoluta, por mais absurda que
possa parecer, e os adeptos “católicos” estão impedidos de contestar sob pena
de cometerem pecado mortal.
Pareceria haver nisso uma simples
restauração da "lei de escravidão religiosa" que S. Paulo declarara
abolida pela "lei de liberdade", que é o Novo Testamento notificado
aos Gentios pelo Cristo, em oposição ao Judaísmo, e para, com efeito, dar corpo
a essa ideia de contramarcha, todos os bispos, no dia da sagração, além da
promessa de submissão absoluta ao Soberano Pontífice Romano, juram manter o
Antigo Testamento, a par do novo.
Tal, à primeira vista, a ideia, algum
tanto opressiva, que fatalmente sugere o decreto de autocracia papal imposto ao
Catolicismo Romano pelos fins do século XIX.
Mas, em se refletindo, desde que se
creia na inteligência divina e se leve em conta os obstáculos que lhe opõe a
ininteligência humana, é de perguntar se esse recuo da liberdade cristã não
seria análogo – em terreno muito outro - à retirada militar ordenada pelo general
Joffre, para ir ter à primeira vitória do Marne,( 12 de
setembro de 1914 que os franceses obtiveram uma importante vitória contra o
exército alemão) e se essa abdicação voluntária do
episcopado católico nas mãos do Sumo Pontífice, Vigário putativo de Jesus
Cristo, não poderia, dar, sob uma impulsão celeste, no estabelecimento do
verdadeiro Cristianismo.
Com o seu exército de bispos, padres,
missionários, religiosos e religiosas, espalhados por toda parte e formados
para lhe obedecerem como ao próprio Deus, o papa poderia, com efeito, produzir
no mundo inteiro, com uma só palavra, o relâmpago e a eletricidade
de obediência que acabariam num instante com todas as divisões,
reconduzindo o Cristianismo à sua “primitiva simplicidade”:
"Deus é o pai de todos os homens e todos os homens devem amar-se uns aos
outros. Somente isto é religião, porque só isto religa os homens entre si. Tudo
mais os divide; pois, não é, religião, mas política, arte ou ciência".
Foi certamente para lhe dar o poder
de efetuar essa volta à revolução religiosa que Jesus Cristo pregou no primeiro
século da nossa era, que a evolução de dezenove séculos fez do papa o senhor
absoluto na Igreja Católica Romana. "Que ele, pois, ouça, ele que tem
ouvido!" Qui habet aures audiendi audiat! clama-lhe o seu
Mestre, Jesus Cristo. Se ele não escutar a voz do Espírito e se obstinar em
querer manter a escravidão à Letra, a Letra matará o Sumo Pontífice de Roma,
como matou o de Jerusalém, porquanto a letra mata, o Espírito é que
vivifica: Littera enim occidit. Spiritus autem vivificat.
O Espírito, ao contrário, unificando sem tirania, nem monopólio todas as
Igrejas, ainda hoje divididas por ortodoxias contraditórias, e reconduzindo-as
à Didaquê primitiva, criaria enfim o verdadeiro Catolicismo: Catolicismo significa Universalismo.
Uma Epístola católica é uma Epístola Universal.
Ah! sou "uma voz que clama no
deserto", vox clamantis in deserto. Creio, porém, firmemente,
que o nosso século é o da passagem decisiva do Cristianismo para o
desabrochamento que de modo claro o Cristo lhe assinalou, porquanto, segundo
diz a parábola evangélica, a unidade de uma árvore tem que desabrochar numa
multidão de ramos dissemelhantes em suas formas e variados nas suas direções,
se bem que vivendo todos da mesma seiva. Esse desenvolvimento livre é
necessário, para que o Cristianismo Romano dê flores, depois frutos, que o
tronco único, embora plantado em Roma, não poderia produzir, acrescentando a
parábola: para convidar e receber "os pássaros do céu", isto é, os
intelectuais, que o tronco inóspito, erguido para o ar qual cepo, mal atraia e
isso mesmo para galhos artificiais e para ninhos administrativos, com proibição
absoluta de deixar que suas ideias se evolem e batam livremente as asas pelo
espaço.
O que digo com relação à Igreja Romana, digo-o das outras
Igrejas: que cada uma, na vida que lhe é peculiar, facilite cada vez mais a
livre expansão dos pensamentos e das obras e pense, em seguida, nas outras
Igrejas que, juntas todas, compõem o jardim variegado do Catolicismo, isto é,
do Universalismo. "Toda árvore que não dá bom fruto será cortada e lançada
ao fogo", diz Jesus Cristo, e "o fruto do Espírito é a caridade, a
alegria, a paz", diz S. Paulo aos Gálatas, não os anátemas recíprocos (5:3;22
- Mas o fruto do Espírito é: amor,
alegria, paz, longanimidade,
benignidade, bondade, fidelidade. Mansidão, autodomínio.
Contra estas coisas não existe Lei.).
.
Os antagonismos das ortodoxias rivais
obstam, sem dúvida, a esse preceito divino de paz e união fraterna; mas, um
meio haveria, parece-me, de fazer que cessassem as competições e que
desaparecessem as divisões entre as Igrejas. O Catolicismo Romano é reconhecido
como sendo o que maior número de súditos conta, entre os que se dizem ao
serviço do Cristo: que, pois, o papa de Roma convide fraternalmente, em nome do
Cristo, os chefes supremos das outras Igrejas para uma conferência fraterna
numa cidade qualquer; que, depois de uma apresentação recíproca e de uma
conversação afetuosa, leiam juntos a Didaquê, catecismo cristão
anterior a Constantino; que todos solenemente se comprometam a não impor jamais
aos seus fiéis nenhum outro dogma posterior a essa primitiva dogmática; que
todos, em seguida, abdiquem das suas pretensões rivais de superioridade
recíproca; que cada um coloque seu nome numa urna e um menino, com os olhos
vendados, tire à sorte o nome do predestinado que o Espírito de Deus escolher
para reconstituir, com a livre cooperação dos outros, o Catolicismo verdadeiro,
na simplicidade dogmática de S. Paulo, e a sua liberdade disciplinar ou
científica, absolutamente alheio às disputas das escolas e dos concílios.
Somente a esse preço o Cristianismo
se tornará Catolicismo, isto é, Universalismo e cada árvore, diferente do
jardim do Cristo será a árvore prometida pelo Evangelho, onde os pássaros do
céu farão seus ninhos, como diz S. Mateus (- o grão de mostarda-embora
seja a menor de todas as sementes, quando cresce é a maior das hortaliças e
tornar-se árvore, a tal po0nto que as aves do céu se abrigam nos seus ramos), pássaros
e árvores de espécies diversas.
“Ouça quem tiver ouvidos de ouvir o
que o Espírito diz às Igrejas, pois que o tempo se aproxima!" declara o
Apocalipse.
Evidentemente,
a todos os funcionários eclesiásticos possuidores de um título elevado na
organização atual do Catolicismo Romano sobram motivos para manterem as
conquistas penosamente realizadas no curso dos séculos, do mesmo modo que a
aristocracia e a realeza, em França, nas vésperas da Revolução, tinham desculpa
para se obstinarem em manter o regime do "bel prazer real", formulado
por Francisco I e constituído sob Luís XIV.
Como é,
com efeito, que um papa gloriosamente reinante, quando celebra a missa
pontifical em S. Pedro de Roma, trazendo à cabeça a tiara, naquela pompa mais
que real aos adornos pontifícios, com a grandiosa corte de cardeais e prelados
cobertos de ouro e púrpura, com um cortejo imenso de padres recamados e
serviçais magníficos, numa atmosfera de adorações de toda a assistência,
concentradas na sua augusta pessoa, poderia admitir que aquele Cristianismo
deslumbrante, tão glorioso para ele papa, não seja o verdadeiro Cristianismo?
Como é
que um arcebispo, um bispo, ao celebrar suas funções eclesiásticas com a
magnificência oficial; como é que um cura das ricas e nobres paróquias de
Paris, recebendo de trinta a quarenta mil francos por um grande enterro ou um
grande casamento, poderiam
imaginar
que uma organização eclesiástica que lhes confere tais honras e honorários não
seja a perfeição absoluta da organização eclesiástica? Considero-os, em
realidade, desculpáveis em afastarem, com um sorriso de desdém, o livro, se
porventura o encontrem, ainda que fosse o Evangelho de S. João, dedicado
"ao papa de gênio que elevar a Igreja Católica, do Cristianismo.
Entretanto,
Monsenhores, a Constituição romana da Igreja é uma criação humana in totum diferente
da instituição divina. Demonstrei-o historicamente “neste volume” e vou
demonstrar logicamente, em poucas palavras, que a fé que consiste em crer-vos
ou crer nos vossos catecismos, não é de modo algum a fé. Ela mesma, ao demais,
o prova, porquanto não produz em absoluto os milagres que Jesus Cristo promete
à fé.
Devo
render-vos a homenagem de reconhecer que, nos vossos catecismos impressos,
ainda ensinais que a fé, a esperança e o amor de Deus são "virtudes que se
reportam diretamente a Deus".
Mas,
praticamente, segundo a formação ativa, por vós, dos vossos fiéis
passivos,
o amor de Deus, sobretudo nas religiosas enclausuradas, se reporta diretamente
à pessoa de Jesus Cristo, ou, ainda mais piedosamente, ao seu coração de carne.
A esperança se reporta às indulgências que vos digneis de permitir ganhemos
durante a nossa vida e se reporta igualmente ao número de missas que vos paguem
por nós, depois da nossa morte. Quanto à fé, a que impondes sem nenhum respeito
humano, consiste em crer sem exame no que denominais "os dogmas da
fé"; pelo único motivo de que assim o ordenais. Contudo, o nosso ensino,
objetar-me-eis, não é ensino nosso, é "o ensino da Igreja".
Admirável
abstração, sem dúvida, essa dama, "a Igreja", como esse senhor
"o Estado", que nunca ninguém teve a honra de ver, senão nos seus
representantes, de maneira nenhuma infalíveis.
"-
O Estado não é infalível, não! mas a Igreja é infalível, sim!"
E seus
representantes também o são! Ninguém o suspeitaria, garanto-vos. Mas, afinal,
Monsenhores, devo crer no ensino da Igreja, não é? porque a Igreja é infalível!
Evidentemente, toda a questão se resume nisso e não noutra coisa. Entretanto,
porque, peço me digais, devo crer na infalibilidade da Igreja?
"- Porque...
- Está a questão embaraçosa, não é,
Monsenhores?
- Absolutamente! Deveis crer na infalibilidade
da Igreja, porque a Igreja vo-lo ordena."
- Sabeis, Monsenhores, que esse raciocínio é
exatamente o que em lógica se chama "um círculo vicioso", isto é, uma
burla, o oposto de uma razão. Se tratais com um espírito dotado de razão,
comigo, por exemplo, ver-vos-eis compelidos a me demonstrar por meio da razão,
do Evangelho, da História, que a Igreja, tal como sempre existiu, ainda existe
sob os meus olhos, é verdadeiramente divina e divinamente infalível. Eis-vos,
portanto, forçados a recorrer à razão e à ciência, para me demonstrar que devo
crer-vos; e eis-vos, pois, sob a base oficial que pretendeis impor à minha fé:
"a autoridade da Igreja", obrigados a chegar à base única: a razão,
isto é, a visão, por mim mesmo, do que motiva a minha fé, ou, seja, a luz. É por
a, com efeito, que a minha fé se reportará a Deus, porque "Deus é
luz" e a luz intelectual é a única manifestação de Deus à razão do homem.
Em Direito,
crer sem ver não é uma fé que se possa qualificar de divina; crer sobre a
palavra dos homens, quaisquer que eles sejam, não é também uma fé a que caiba
aquele qualificativo, mas confiança humana. Em matéria de fato, no tocante ao
ensino religioso, essa confiança dos fiéis na palavra da sua respectiva Igreja
- porquanto elas são muitas e se
excomungam
umas às outras - gera, não a unidade nem a fraternidade, mas divisões,
hostilidades e fanatismos, que dê certo a autoridade da Razão não geraria. Nas ciências
humanas, respeito às quais o aluno pode verificar materialmente as afirmações
de seus mestres, o ensino destes não poderia ser uma exploração; na ciência
espiritual, porém, a fé por procuração, segundo declaração mesma da Igreja, não
é, de modo nenhum, uma certeza. Porque, afinal, segundo vós outros, católicos
romanos, a fé dos ortodoxos gregos ou russos nas suas Igrejas grega ou russa é
um erro; entretanto, para eles, o motivo de fé é exatamente idêntico ao dos
vossos fiéis: crer no que lhes ensina a Igreja deles.
Círculo
vicioso, manifestamente, e, portanto, o contrário de uma virtude; petição de
princípio e, portanto, fonte de erros, não infalibilidade.
Não há
mister, em verdade, discutir todos os textos do Evangelho e todos os fatos da
História, para demonstrar que nenhuma Igreja é infalível, nem a Igreja romana,
nem as outras. Basta comprovar que todas são acordes em atribuir a Deus está
abominável crueldade: a condenação eterna.
Renunciem,
pois, todas à pretendida infalibilidade, que é uma tirania intelectual; voltem
ao Cristianismo do Cristo, que unicamente pede a fraternidade entre todos, no
amor do Deus único, Pai de todas as criaturas. Pelo que toca ao conhecimento de
Deus, não peçais a cada um, senão "segundo a medida de fé que Deus
mediu para cada um", escreveu formalmente São Paulo, "somente
essa fé constitui uma adoração racional"(exorto-vos, portanto,
irmãos, pela misericórdia de Deus: esse é o vosso culto espiritual E esse não
vos conformeis com esse mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente a
fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom,, agradável e
perfeito.Rm 12:1,3). E Deus mede a cada um, diz Jesus, segundo a
capacidade de cada um: unicuique secundum propriam virtutem (Mt
25;15- a um deu cinco talentos, a outro dois, a outro um. A cada um de acordo
com a sua capacidade. E partiu imediatamente).
A missão
do Clero não é impor a sua autoridade: Nolite vocari magistri,
magister vester unus est Christus. A missão do Clero é
instruir-se cada vez melhor e devotar-se cada vez mais: Qui primus
est inter vos fiat vester minister . Ele desceu a encosta dos
arrastamentos humanos, é-lhe preciso subir a encosta por onde desceu. Transformar-se
ou perecer, tal o dilema que o progresso da liberdade e da ciência impõe, a
todas as Igrejas, em primeiro lugar à Igreja romana que, sendo a mais poderosa,
tem maiores responsabilidades.
FONTE:
Padre Alta (Doutor pela Sorbonne) sexta-feira santa de 1921 ( (nascido Calixte Mélinge em 1842 em Montlieu-la-Garde e falecido em 1933) é um escritor e clérigo francês, autor de
vários livros relacionados ao gnosticismo . O pseudônimo vem
de um livro de Joséphin Péladan , The Supreme Vice (1884).)
Tradução de Guillon Ribeiro
Editores Vigot Frères, Paris
https://aron-um-espirita.blogspot.com
NOTA:
“Evidentemente vocês não encontrarão
absolutamente nada do Padre Alta na web pois a igreja católica já se preocupou
em deletar todos os dados referentes a ele. Só existe algo em seus livros
alguns ainda em sebo”.
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