O “ADVOGADO” PARACLETO CONSOLADOR
João, 14:15-24
15. “Se me amais, observeis meus
mandamentos, 16. e rogarei ao Pai e ele
vos dará outro paraclito (advogado, conselheiro), para que convosco permaneça
para sempre, 17. O Espírito da verdade, que o mundo não pode acolher, porque
não o vê nem o conhece; vós o conheceis, porque permanece convosco . 18. Não
vos deixarei órfãos: eu virei a vós (já veio diversas vezes aos discípulos).
19. Ainda um pouco e o mundo não mais me vera, mas vós me vereis (promessa
cumprida), porque eu vivo e vós vivereis. 20. Nese dia, vós compreenderei que
estou em meu Pai e vós em mim, e eu em vós. 21. Quem tem meus mandamentos e os observa,
é quem me ama; e quem me ama será amado por meu Pai e eu o amarei e me manifestarei
a ele”. 22. Judas (não o Iscariotes, mas o irmão de Tiago) lhe diz: Senhor, porque
te manifestaras a nós, e não ao mundo? 23. Respondeu-lhe Jesus: “Se alguém me
ama, guardara minha palavra e meu Pai o amará e a ele viremos e nele
estabeleceremos faremos morada. 24. Quem não me ama, não guarda minhas palavras;
e minha palavra não é minha, mas do Pai que me enviou”.
Vamos começar aqui a analisar algumas
palavras. O termo paráklêtos é vulgarmente transliterado como paráclito ou
ainda paracleto; ou é traduzido como Consolador, Advogado, conselheiro ou
Defensor de acordo com a religião ou seita. Examinando-o, vemos que é formado
de para (ao lado de, junto de) e de klêtos do verbo kaléô (chamar). Então, paráklêtos
é aquele que é chamado para junto de alguém: o Evocado. A melhor tradução literal
é ADVOGADO, que deriva do latim advocatus (formado de vocatus, chamado e ad,
para junto de alguém). Apesar de o sentido atual dessa palavra ter mudado de
tal forma que não caberia aqui, por ter se vulgarizado e desvirtuado seu princípio,
ainda assim, não encontramos termo melhor. O sentido de paráklêtos é mais
passivo que ativo: não exprime aquele que toma a iniciativa de defender-nos,
mas sim aquele que nós chamamos ou evocamos ou invocamos para permanecer junto
de nós. Esse advogado É dito, logo a seguir, o Espírito verdadeiro (tò pneuma
tês alêtheias). Ainda aqui afastamo-nos da tradição, que apresenta a tradução
literal: o Espírito da Verdade. O raciocínio alerta-nos para o sentido racional
e logico: que pode exprimir a junção dessas duas palavras? equiparando essa
frase com a outra de João (1.“ João, 2:16-“ ...e disse aos que vendiam pombas:
tirai tudo isto daqui; não façais da casa de meu pai, uma casa de comercio”...),
onde se fala do espirito da mentira, verificamos que, em ambos os passos, há
evidentemente uma figura de hendiades. Trata-se realmente de Espirito
verdadeiro e de espirito mentiroso ou enganador. Mais adiante (vers. 26) o Espírito
verdadeiro, ou evocado, É dito o Espírito, o Santo, expressão que levou os teólogos
a confundi-lo com a terceira pessoa da Santíssima Trindade. Observemos a oposição
nítida do ensino: o Espirito verdadeiro, isto É o Espírito real e genuíno, É o
que não teve princípio nem terá fim, o Espírito eterno, individuação da
Centelha divina; enquanto o espirito mentiroso ou enganador É aquele que ilude
as criaturas, que o julgam eterno e real, quando É apenas transitório e perecível:
aprendemos a oposição entre o Eu profundo e o eu menor; entre a Individualidade
e a personagem; entre o Cristo e a criatura; entre o Espirito VERDADEIRO E REAL
e o espirito ENGANADOR E TRANSITRIO que, sistematicamente distinguimos,
escrevendo o primeiro com maiúscula (Espírito) e o segundo com minúscula (espírito).
O termo mundo (cosmos) É empregado como em outros passos de João (1:10-...ele
estava no mundo...; 7:7-...o mundo não vos pode odiar...; 12:31-...é agora o
julgamento deste mundo...; 15:18,19-...se o mundo vos odeia sabei que,
primeiro, me odiou a mim se fosseis do mundo...; 16:8, 11-...estabelecerá a
culpabilidade do mundo...; 1.” João, 2:15-...não ameis o mundo nem o que há no
mundo..., 16, 17-...porque tudo o que há no mundo;... 3:1-...se o mundo não nos
conhece,...13; 4:5-...eles são do mundo...;5:4-...vence o mundo..., 5, 19-...e
que o mundo inteiro...). A expressão não vos deixarei órfãos deve colocar-se ao
lado da que os discípulos são carinhosamente chamados filhinhos (João, 13:33-...por
pouco tempo ainda estou convosco...). Ao falar de Judas, João tem o cuidado de
esclarecer não o Iscariotes. Nas listas de Mateus (13:55-...e os seus irmãos
Tiago, José, Simão e Judas...) parece tratar-se do Emissário a denominado
Tadeu. Lucas di-lo irmão de Tiago o menor, primeiro inspetor de Jerusalém e
irmão de Jesus.
***
“Se amardes o Cristo (se me amardes)
executareis meus mandamentos, e eu rogarei ao Pai e vos dará outro advogado,
para que convosco esteja no eon, o Espírito verdadeiro”. O verbo “amar”, aqui,
é ágape, que exprime o amor de predileção, de união profunda. Esse amor, que
revela e exige sintonia perfeita entre o amado e o amante, faz que este,
espontânea e alegremente se coloque em posição de realizar todos os desejos do
amado, observando intuições e inspirações que lhe chegam, sem deixar-se levar
pelas distrações e injunções externas. Qualquer desejo do Cristo interno,
através do Eu profundo, será uma ordem, um “mandamento” para a personagem
transitória. Neste caso, ao verificar que a personagem por ele criada para a
evolução do Espírito é obediente e fiel, correspondendo integralmente à sua
expectativa, realizando e vivendo suas orientações, o Eu profundo, através do
Cristo interno, rogará ao Pai para que permita a descida definitiva e
permanente, durante todo o eon, da Força Cristônica, ou seja, evocará a ligação
do Cristo, verdadeiro Espírito, para que fique ligado e “morando” na
personagem, como prêmio à sua fidelidade sintonia perfeita. Então o Espírito
real do Homem, o Espírito já santo, porque santificado, não o abandonará durante
o ciclo evolutivo, jamais correndo ele perigo de haver o abandono da personagem
por parte da Individualidade. Esse Espírito verdadeiro “não pode o mundo
receber, porque não o vê nem o conhece mas vós o conheceis, porque habita em
vós e está em vós”; o mundo, que representa aqui aqueles que ainda estão
voltados para as coisas exteriores, jamais têm condição de ver e conhecer
aquilo que se passa dentro deles mesmos: seu olhar estende-se para horizontes
longínquos - prazeres, cobiça de agregar a si riquezas perecíveis julgadas
eternas, erudição, fama, e glória das personagens e para as personagens e não
têm condições de humildemente enclausurar-se em si mesmo, renunciando e
esquecendo tudo o que vem de fora. Aqueles, todavia, que negarem e esquecerem
sua personagem transitória e mergulharem no abismo sem fundo de seu Eu, esses
conhecem seu “Morador Divino”, com ele mantém as mais íntimas relações de
afeto, confabulam, pedem orientações, e prestam conta de seus atos e
pensamentos; em Sua mão entregam todos os problemas que surgem, e a qualquer
momento sabem que podem encontrá-lo, porque “neles habita e está neles”, mais
valioso que o universo inteiro com suas riquezas e belezas mais importante que
todos os seres humanos com suas glórias e sua fama. Neste ponto, o Cristo
manifestado em Jesus fala diretamente para confortar o coração dos discípulos:
“eu não vos deixarei órfãos, volto a vós”; embora não mais no corpo físico de
Jesus, mas no âmago de cada um. No corpo de Jesus, o mundo não mais o verá
dentro de pouco tempo, porque esse corpo será levado alhures ("num outro lugar" ou "em outro momento”).
“Mas vós vedes, porque eu, o Cristo, vivo, e vós vivereis em mim e por mim”,
pois “quem vive e sintoniza comigo, jamais conhecerá a morte” (João, 11:26-...e
quem vive e crê em mim, jamais morrera...). E então, nesse dia em que
conseguirmos VIVER no Cristo, “conhecereis (tereis a gnose plena) de que EU (o
Cristo) estou no Pai, e vós em mim e eu em vós”. Nada pode ser mais claramente
declarado, do que a revelação dessa verdade: o Cristo interno está em nós, e
nós estamos no Cristo interno. Por que não O percebemos? Por falta, ainda, de
sintonia. No momento em que elevarmos nossa sintonia até a do Cristo, pela
negação e renúncia total, absoluta e definitiva a tudo o que é externo,
inclusive a nosso eu, pequeno e vaidoso, e a nosso intelecto cheio de
convencimento e orgulho, nesse momento poderemos sintonizar com o Cristo
interno, através de nosso Eu profundo, de modo total: é o Cristo que viverá em
nós (cfr. Gal. 2:20-...já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim...).
É o que faz Salomão exclamar em êxtase: “vosso Espírito incorruptível está em
todos” (Sab. 12:1-...todos levam teu espírito incorruptível...). Repete-se aqui
a fórmula: “Quem têm meus mandamentos e os executa”, isto é, quem os conhece e
reconhece e os vive intensa e permanentemente, “é quem me ama”; em grego,
literalmente: “é meu amador ou amante” (ho ágape me). E quem me ama, será amado
por meu Pai e eu o amarei e a ele eu mesmo me manifestarei (esphans auti
emautn)”. Essa é uma das frases mais fortes, uma das promessas mais
confortadoras do Cristo. Não se dirige apenas aos Emissários ali presentes, nem
a Seus discípulos imediatos, durante Sua peregrinação terrena na Palestina, mas
sim A TODOS OS QUE AMAM O CRISTO. Muitos queixam-se da dificuldade de conseguir
a união com o Eu profundo e posteriormente a unificação com o Cristo. Mas a
condição de obter-se isso, É uma só: Ama-lo e seguir lhe as ordens,
obedecer-lhe as intuições, viver-lhe os ensinos, renunciando a tudo, com
desapego total (não abandono!), absoluto, permanente de objetos, de pessoas, de
seu próprio eu pequeno, de seu próprio intelecto, de sua própria cultura, de
todos os seus conhecimentos humanos. De que vale a própria “sabedoria” humana
da personagem? “A Sabedoria da carne (da personagem) é adversária de Deus”
(Rom. 8:7-...uma vez que o desejo da carne é inimigo de Deus...); e mais: “Se
alguém, entre vós, se julga sábio neste mundo, torne-se louco para tornar-se
sábio, pois a sabedoria deste mundo é loucura perante Deus” (1.ã Cor. 3:1819-...ninguém
se iluda: se alguém dentre vós julga ser sábio aos olhos desse mundo, torne-se
louco para ser sábio...). Quem assim ama o Cristo, entra plenamente na sintonia
crística (reino dos céus) e, logicamente, na sintonia do Pai, na frequência do
SOM cósmico, cuja tônica, em cada planeta, é dada pela tônica de seu
Governador, o Pai plasmado e sustentador de tudo. Estabelecida a sintonia no
receptor, a onda da Estação transmissora entra perfeitamente, sem distorções: é
a união do amor mais perfeito, a onda hertziana em vibrações de beleza, de bem,
de verdade, que entra e replena o circuito do receptor bem sintonizado em alta
fidelidade, numa unificação total, no amor mais puro e absorvente. E se o
aparelho é aquilo que denominamos de “televisor”, além do som, entra a imagem:
“eu mesmo me manifestarei a ele”. O verbo emphan significa exatamente
“manifestar-se visivelmente” ou “fazer-se ver”, isto é “mostrar-se”; daí ter
sido dito: “felizes os limpos (desapegados) de coração, porque verão a Deus
(Mat. 5:8;-...felizes os puros de coração, porque verão a Deus... ). Visão
contemplativa, não de uma forma física, mas sem forma, pois estamos no plano
mental (arupa) onde só se percebe o caminho (Cristo), o Som que é a Verdade
(Pai) e a Luz que é a Vida (Espírito, a Divindade). Jamais esperem os
iniciantes ver com olhos físicos; nem mesmo os médiuns que se ambientaram no
astral, esperem ver com o olho de Shiva(Na testa, a figura mitológica do deus
Shiva tem um terceiro olho(conhecido como
o "Olho de Shiva") que
simboliza a inteligência e o fogo destrutivo da renovação.) a
forma humana do Cristo ou do Pai: é mais alto, mais elevado, mais sublime.
Trata-se da absorção, pela mente, das ondas espirituais que emanam do Pai como
SOM e do Espírito Santo como LUZ e envolvem e impregnam o Espírito do Adepto, e
se transubstanciam nele, numa fusão daí por diante indissolúvel e irreversível:
mais uma vez o Cristo se transubstancia na criatura, e mais uma vez teremos um
Avatar, um Hierofante (termo
usado para designar os sacerdotes da alta hierarquia dos mistérios da Grécia e do Egito. É o sacerdote supremo, que pode ser chamado também de Sumo
Sacerdote) cristificado, um Buddha. Judas não
contém sua curiosidade: por que seria que essa manifestação, prometida aos
discípulos que O amassem, não seria feita ao mundo? Não seria um acontecimento
fabuloso se isso ocorresse, elevando todos a planos superiores? Volta o Cristo
a paciente e caridosamente elucidar o discípulo insofrido: “Se alguém me ama,
executa meu ensino”, no sentido de cima: obedece, VIVE o ensino. E também em
outro sentido: realiza meu Logos, ou seja, passa a VIVER MEU SOM, a vibrar na
mesma nota fundamental, na mesma frequência vibratória, no mesmo tom. E repete
uma vez mais: “o Pai o amará e eu (o Cristo) e o Pai viremos (como uma só
coisa) e habitaremos nele”: e passaremos a viver em lugar dele, e nos
transubstanciaremos nele.
Não é possível ser mais explícito nem
proferir palavras mais consoladoras, ensinos mais profundos: a união será
permanente: habitaremos (monên par 'autôi poiêsómetha, isto é, faremos nele
nossa moradia) ou permaneceremos nele, dentro e em redor dele. Não há mais
separação, não há mais distinção. A que mais pode aspirar-se nesta Terra?
Volta-se, então, para o outro lado, ao referir-se ao mundo: “Quem não me ama”,
preferindo as exterioridades superficiais do mundo e seu próprio eu pequeno,
“não realiza evidentemente meu ensino” e, logicamente, não tem possibilidade de
perceber a sintonia do Cristo interno: recebe e realiza as ondas de outras
estações emissoras. E mais uma vez é dada garantia absoluta da fonte de onde
emanam as revelações; “o ensino que ouvis (ho logos hn akoœete,) não é meu, mas
do Pai que me enviou”. Ainda uma vez revela-se a obediência cega às ordens do
“Pai, que é maior que eu”: o Filho faz a vontade do Pai sem titubear, repete o
ensino do Pai, revela o Logos (SOM, Palavra) paterno, como lídimo intérprete
que não trai a confiança nele depositada.
FONTES:
Bíblia de Jerusalém
Carlos T. Pastorino
Huberto Rodhen
Haroldo D. Dias
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