A
PÉROLA PRECIOSA
(Mt
13, 45-46)
O
Reino dos Céus é ainda semelhante ao negociante que anda em busca de perolas
finas. Ao achar uma perola de grande valor, vai, vende tudo o que possui, e a
compra.
Quando
o homem descobre o Reino dos Céus, não se interessa mais pelos reinos da Terra
As
pérolas verdadeiras crescem no interior de certas conchas de moluscos, que vivem
nas profundezas de mares tropicais. A pérola é uma secreção solidificada do
corpo gelatinoso do molusco. Se não houver lesão alguma no corpo do molusco,
não se forma pérola. Enquanto a pérola está encerrada na concha, não manifesta
o seu maravilhoso brilho; somente quando exposta à luz solar é que revela o seu
esplendor, que é o reflexo dos raios luminosos. Estes raios são de luz branca, ou
melhor, incolor. A pérola, porém, reflete todas as cores do arco-íris, em
diversas tonalidades opalescentes, devido à consistência peculiar da sua superfície
nacarada.
Se
o Reino dos Céus é semelhante a uma pérola preciosa, qual o traço de semelhança
entre aquele e este?
A
pérola nasce nas profundezas do mar, mas a sua beleza só se revela à luz solar.
E não é isto que se dá com o Reino dos Céus? Tem a sua sede nas profundezas da
alma humana, e não na superfície da vida externa; mas o seu esplendor só se revela
plenamente na luz da vida diária.
Não
faz isto lembrar as palavras do Mestre sobre a “luz debaixo do alqueire”, e “a
luz no candelabro”? A pérola da experiência mística se revela na vivência ética;
o Ser invisível se manifesta no agir visível.
As
palavras de Mahatma Gandhi sobre a “verdade dura como diamante e delicada como
flor de pessegueiro” bem poderiam lembrar a dureza da pérola e a sua beleza.
Para
descobrir uma dessas pérolas preciosas, deve o homem mergulhar em tenebrosas e
perigosas profundezas – e não é que o homem só encontra o Reino dos Céus em
misteriosas profundidades? Quem nunca abandonou as cômodas superfícies do seu
ego profano e mergulhou nas ignotas regiões do seu Eu divino; quem nunca
abandonou as praias e os litorais de uma vida fácil e se aventurou ao alto-mar
da Divindade, nada sabe da pérola preciosa da sua alma.
É
estranho que a pérola só se forme depois que o molusco sofreu um ferimento – e
quando foi que um homem encontrou a pérola do Reino dos Céus sem ter passado
por uma experiência dolorosa? O próprio Cristo-Jesus não pôde entrar em sua
glória sem passar pelo sofrimento e pela morte. Enquanto o homem não sofre,
identifica-se com o seu ego humano; mas quando submetido a um grande sofrimento,
verifica a diferença entre o seu ego humano e o seu Eu divino. O autoconhecimento,
base da auto-realização, dificilmente acontece a um homem que não tenha passado
por experiências dolorosas. A ilusória identificação do homem com o seu ego e o
descobrimento da verdadeira alteridade do seu Eu é, quase sempre, provocada por
um sofrimento, sobretudo metafísico. “Duro te é recalcitrar contra o aguilhão”,
dizia a voz misteriosa que Saulo de Tarso ouviu quando tombou às portas de
Damasco, “e eu lhe mostrarei quanto terá de sofrer por meu nome”.
Esse
mesmo Paulo chega ao ponto de afirmar que “sem efusão de sangue não há
redenção”, isto é, sem sofrimento próprio não há cristificação.
A
pérola do Reino dos Céus só começa a nascer depois que o homem foi ferido no
seu ego idade humana.
Diz
a parábola que o homem, depois de encontrar essa pérola preciosa, foi vender
tudo o que tinha a fim de adquiri-la. “Quem não renunciar a tudo que tem não
pode ser meu discípulo”. “Quem não nascer de novo não pode ver o Reino de
Deus”.
Parece
que há uma eterna incompatibilidade entre o ter e o Ser, como entre treva e
luz, quantidade e qualidade. Antes de atingir a qualidade do seu Ser, corre o homem
atrás das quantidades do ter ou dos teres. Mas depois de descobrir o seu Ser
qualitativo, torna-se ele indiferente a seus teres quantitativos. E quando as
circunstâncias o obrigam a possuir certos objetos externos, possui-os com estranha
leveza e serenidade; não se fanatiza por eles, nem jamais é possuído por aquilo
que possui. O homem profano não possui as suas posses; é por elas
possuído
e possesso. A diferença entre possuidor e possuído é apenas de uma letrinha, o
“r” – o “r” da redenção. Quando o possuído passa a ser possuidor não possuído,
é ele remido da tirania do possuído e vive na soberania do possuidor.
Quem
possui a pérola preciosa do Reino dos Céus, com alegria se desfaz de todas as
antigas posses, porque a nova posse o tornou imensamente feliz. Nada mais valem
para ele as mais cobiçadas facticidades dos profanos, depois que se apoderou da
Realidade do iniciado.
Quem
entrou na posse da pérola preciosa do Reino dos Céus, esquece-se de todos os
sacrifícios que fez para adquiri-la. Todos os caminhos estreitos e todas as
portas apertadas desapareceram em face do jugo suave e do peso leve de uma
felicidade sem limites.
FONTE:
Carlos
T. Pastorino
Huberto
Rodhen
Bíblia
de Jerusalém
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