ENSAIO
DE INTERPRETAÇÃO SOBRE A DOUTRINA DOS ANJOS DECAIDOS
O texto nos mostra que a justiça de Deus atua em matizes que
corroboram a perfeição da Sua Criação. Observa ainda que todos os princípios
seguem a sua sequência lógica, independente da limitada compreensão do homem
nos mais diversos aspectos da vida.
A questão das origens sempre excitou a
curiosidade, sobretudo no que diz respeito a procedência do homem em tal
proporção que hoje é impossível as pessoas sensatas aceitarem ao pé da letra o
relato bíblico nele vendo apenas uma dessas alegorias de que é prodigo o estilo
oriental.
Aliás a ciência vem oferecendo a prova demonstrar
por meios irrefutáveis a impossibilidade material da formação do globo em seis
vezes 24 horas, ou seja, seis dias.
Ante a evidencia dos fatos escritos em
caracteres irrecusáveis nas camadas geológicas, a igreja teve que se submeter a
opinião dos sábios e com eles concordar que os seis dias da criação representam
seis períodos de extensão indeterminada; como fizeram outrora em relação ao
movimento da Terra.
Se,
pois, o texto bíblico é suscetível de interpretação quanto a este ponto capital
também poderá ser em relação a outros pontos, notadamente sob o aparecimento do
homem na terra; sua origem e o sentido que deve ser atribuído a qualificação do
que seriam os “anjos decaído”!
Como
princípio das coisas estão os segredos de Deus que não revela senão a medida
que julga conveniente ficamos reduzidos a conjectura.
Muitos
sistemas foram imaginados para resolver essa questão, mas nenhum até hoje
satisfaz completamente a razão.
Tentaremos
também, levantar uma ponta do véu e seremos mais felizes que nossos
antecessores?
Ignoramos e só o futuro dirá. A
opinião que apresentamos é pois uma opinião pessoal, do grupo de estudos, pois
parece concordar com a razão e a lógica que , aos nossos olhos,
lhe dá ,um certo grau de probabilidade.
antes de tudo; Constatarmos,
que, se é possível descobrir alguma parcela da verdade, com a ajuda da
teoria espírita; ela já resolveu uma imensidão de problemas até agora insolúveis,
e é com a ajuda das balizas que ela nos oferece que vamos tentar remontar à cadeia dos tempos.
O sentido literal de certas passagens dos livros sacros, contraditados pela
ciência, repelidos pela razão, produziu muito mais incrédulos do que se pensa, dada a obstinação de se fazer
delas artigos de fé; e se uma interpretação racional os fizer essa aceitar, evidentemente,
reaproximaria da Igreja os que dela se afastaram.
Mas Antes de prosseguir, é essencial que entendamos sobre as
palavras. Quantas disputas não deveriam a sua perpetuação por causa da
ambiguidade de certas expressões, que cada um tomava no sentido de suas ideias
pessoais! Nós o Demonstramos no O Livro dos Espíritos, a propósito do vocábulo alma, mostramos, claramente, que a
acepção que tomamos, cortamos pela raiz qualquer controvérsia. A palavra anjo
está no mesmo caso; empregam indiferentemente no bom ou mau sentido, dizendo:
os anjos bons e os maus; o anjo da luz e o anjo das trevas; de onde se segue
que, em sua acepção geral, significa apenas Espírito. Evidentemente, é neste
último sentido que deve ser entendido ao se falar de anjos decaídos e de anjos
rebeldes. É conforme a Doutrina Espírita, nisto concordando com vários
teólogos, os anjos não são seres de criação privilegiados, isentos de um
trabalho especial, de um favor imposto aos outros, mas Espíritos chegados à
perfeição por seus esforços e méritos.
Se fossem seres criados perfeitos, sendo a revolta contra Deus
sendo um sinal de inferioridade, os que se revoltassem não poderiam ser anjos.
Diz A Doutrina que os Espíritos progridem, mas não retrogradam,
porquanto jamais perdem as qualidades que adquiriram; ora, a rebelião, por
parte de seres perfeitos, seria uma retrogradação, desde que só ela se concebe
partindo de seres ainda atrasados.
Para evitar qualquer equívoco, conviria reservar a qualificação de
anjos para os Espíritos puros, e chamar os demais simplesmente de Espíritos
bons ou maus; como entretanto prevaleceu o emprego dessa palavra para os anjos
decaídos, aceitaremos e a tomamos na acepção geral, e ver-se-á que, neste caso,
que a ideia de queda e de rebelião é perfeitamente agressiva.
Não conheceremos, jamais, o ponto de partida da alma humana;
tudo o que sabemos é que os Espíritos são criados simples e ignorantes; que
progridem intelectual e moralmente; que, em virtude de seu livre arbítrio, uns
tomaram o bom caminho e os outros o caminho errado; que, uma vês ao pé do
lamaçal, nele afundaram mais e mais; que, depois de uma sucessão ilimitada de
existências corporais cumpridas sobre a Terra ou em outros mundos, depuraram- se
e alcançaram à perfeição, que os aproxima de Deus.
Um ponto de difícil compreensão
é a formação dos primeiros seres vivos da Terra, cada um em sua espécie, desde
a planta até o homem; a esse respeito a teoria contida, no Livro dos
Espíritos, nos parece a mais racional, conquanto
só incompletamente e de maneira hipotética, resolva esse problema, que cremos insolúvel
tanto para nós quanto para a maioria dos
Espíritos, a quem não é dado penetrar o mistério das origens.
Se os interrogamos a respeito, os mais sábios dizem que não sabem;
mas outros, menos modestos, tomam a iniciativa e a postura de reveladores,
ditando sistemas, produtos de suas ideias pessoais, que dão como verdade
absoluta. É contra a mania dos sistemas de certos Espíritos, com respeito ao
princípio das coisas, que devemos nos precaver porque, aos nossos olhos, prova
a sabedoria dos que ditaram O Livro dos Espíritos, é a reserva que se guardaram sobre as questões dessa natureza.
Na nossa opinião, não é uma prova de sabedoria decidir essas questões de
maneira absoluta, como alguns o fazem, sem inquietar-se com as impossibilidades
materiais resultantes dos dados fornecidos pela ciência e pela observação. O
que dizemos do aparecimento dos primeiros homens na Terra se entende quanto à
formação dos corpos; porque, uma vez formado o corpo, é mais difícil conceber
que o Espírito vem tomar conta dele. Considerando o corpo, o que nos propomos a
examinar aqui é o estado dos Espíritos que os animaram, a fim de chegar, se
possível, a definir, de maneira mais racional do que se tem feito até agora, a
doutrina da queda dos anjos e do paraíso perdido.
Se não admitirmos a
pluralidade das existências corpóreas, forçoso é admitir que a alma é criada ao mesmo tempo
que o corpo; porque, de duas coisas uma, ou a alma que anima o corpo em seu
nascimento já viveu, ou não viveu; entre
a duas hipóteses, não há meio termo;
ora, da segunda hipótese, aquela em que a alma não viveu sugere uma multidão de
problemas insolúveis, tais como a diversidade de aptidões e de instintos,
incompatíveis com a justiça de Deus, a sorte das crianças que morrem em tenra
idade, a dos cretinos e dos idiotas, etc.; enquanto tudo se explica
naturalmente se admitindo que a alma já viveu e traz, ao encarnar um novo corpo, o que havia adquirido
anteriormente. Assim é que as sociedades progridem gradualmente; sem isso, como
explicar a diferença que existe entre o estado social atual e o dos tempos de
barbárie? Se as almas fossem criadas ao mesmo tempo que os corpos, as que
nascem hoje são tão novas, tão primitivas quanto aquelas que viviam há mil
anos; acrescente-se que, entre elas, não haveria nenhuma conexão, nenhuma
relação necessária; elas seriam completamente independentes umas das outras;
por que, então as almas de hoje seriam mais favorecidas por Deus que as antepassadas?
Porque compreenderiam melhor? Porque têm instintos mais depurados, hábitos mais
suaves? Porque têm a intuição de certas coisas sem tê-las aprendido? Desafiamos
que saiam dessa dificuldade, a menos que admitam que tenha Deus criado almas de
diversas qualidades, segundo os tempos e os lugares, proposição inconcebível
com a ideia de uma justiça soberana. Dizei, ao contrário, que as almas de hoje
já viveram em épocas recuadas; que foram bárbaras, mas progrediram; que, a cada
nova existência, elas trazem as aquisições das existências anteriores; e que,
por conseguinte, as almas dos tempos civilizados não foram criadas mais
perfeitas, mas que se aperfeiçoaram com o tempo, e só assim se teria uma única explicação
plausível da causa do progresso social.
Tiradas da teoria da reencarnação, estas considerações são
essenciais para
compreensão de um fato do que abordaremos adiante.
Embora os Espíritos possam encarnar em diversos mundos, parece
que, em geral, eles cumprem um certo número de migrações corporais no mesmo
globo e no mesmo meio, a fim de poderem melhor aproveitar melhor a experiência
adquirida; não saem desse meio senão para entrar num pior por punição, ou num
melhor por recompensa. Disso resulta que, durante um certo período, a população
do globo é composta por mais ou menos
Espíritos, que ali reaparecem em diversas épocas, até atingirem um grau de
depuração suficiente para irem habitar mundos mais avançados.
conforme ensino dado pelos Espíritos superiores, essas
emigrações e imigrações dos Espíritos encarnados na Terra ocorrem de vez em
quando em tempos individualmente; mas, em certas épocas, elas se operam em
massa, em consequência das grandes revoluções que fazem desaparecer quantidades
consideráveis, sendo substituídos por
outros Espíritos que de alguma sorte na Terra ou em parte dela constituem, uma nova geração.
O Cristo pronunciou uma frase notável que como muitas outras
tomadas ao pé da letra não foi compreendida, pois ele quase sempre falava por imagens
e parábolas. Anunciando as grandes mudanças no mundo físico e no mundo moral,
disse ele: em verdade vos digo, que não
passará esta geração sem que tudo isso aconteça. ora, a geração do tempo do Cristo já passou há
mais de vinte séculos sem que estas coisas tenham acontecido; disso podemos concluir,
que o Cristo ou se enganou, o que não é admissível, ou que suas palavras tinham
um sentido oculto, e foram mal interpretadas.
Se nós nos reportarmos ao que dizem os Espíritos, não
somente a nós, mas aos médiuns de todos os países, chegamos ao cumprimento dos
tempos previstos, uma época de renovação social, isto é, uma época de uma dessas grandes emigrações
dos Espíritos que habitam a Terra. Deus, que os havia enviado para melhorarem,
os deixou o tempo necessário para progredirem, fê-los conhecer as suas
leis, primeiro por Moisés, depois pelo Cristo;
advertidos pelos profetas; em suas reencarnações sucessivas, puderam aproveitar
esses ensinos; agora os tempos em vão chegar e aqueles que não aproveitaram da
luz, aqueles que violaram as leis de Deus ignoraram seu poder, deixarão a Terra
onde, doravante, estariam deslocados no meio pelo progresso moral que se realiza, ao qual não poderiam trazer senão obstáculos
quer como homens, quer como como
Espíritos. A geração que o Cristo se referia, não podendo ser dos homens que viviam
no seu tempo, corporalmente falando, deve se entender pela geração dos
Espíritos que na Terra percorreram, por diversos períodos de suas encarnações e
que irão deixá-la.
Serão substituídos por uma nova geração de Espíritos que, mais
avançados moralmente, farão reinar, a lei de amor e de caridade ensinada pelo
Cristo, e cuja felicidade não será perturbada pelo contato dos maus, dos
orgulhosos, dos egoístas, dos ambiciosos e dos ímpios. Parecia mesmo, no dizer
dos Espíritos, que entre as crianças que nascem atualmente, muitas são a
encarnação de Espíritos dessa nova geração. Quanto aos da antiga geração os que
houverem bem merecido, mas que, no entanto, não tiverem ainda atingido o grau
de depuração suficiente para alcançarem os mundos mais adiantados, poderão
continuar a habitar a Terra e aqui passarem ainda algumas encarnações, mas, ao invés
de ser uma punição, será uma recompensa, visto que serão mais felizes por
progredirem. O tempo em que desaparece uma geração de Espíritos, para dar lugar
a outra, pode ser considerado como fim do mundo, isto é, do mundo moral.
Em que se tornarão os Espíritos expulsos da Terra? Os próprios
Espíritos nos dizem que aquele irão habitar mundos novos, onde encontrão seres
ainda mais atrasados do que aqui, aos quais estão encarregados de fazer
progredir, transmitindo-lhes o produto dos conhecimentos que já adquiriram. O
contato do meio bárbaro, em que se acham, ser-lhes-á, uma cruel expiação, e uma
fonte incessante de sofrimentos físicos e morais, dos quais terão tanto mais
consciência quanto mais desenvolvida for sua inteligência; mas essa expiação
será, ao mesmo tempo, uma missão que lhes oferecerá os meios de resgatar seu
passado, conforme a maneira pela qual desempenharem. Ali, sofrerão ainda uma
série de encarnações, durante um período de tempo mais ou menos longo, no fim
do qual, aqueles que tiverem merecimento, serão retirados para talvez a Terra
enquanto os da Terra por sua vez, ascenderão gradualmente, até o estado de
anjos ou puros Espíritos.
É muito demorado, dirão alguns, não seria mais agradável ir diretamente
da Terra ao céu? Sem dúvida, mas, com esse sistema, tendes a alternativa de ir de
um só tacada da Terra para o inferno, pela eternidade das eternidades; ou então
admitir que a soma das virtudes necessárias para ir diretamente da Terra para
sendo muito rara, poucos homens estarão seguros disso possuir; de onde resulta
que é maior a possibilidade de se ir para o inferno do que de ir para o
paraíso. Não é preferível fazer uma caminhada mais longa e estar seguro de se
chegar no fim? No estado atual da Terra, ninguém se preocupa de a ela voltar, e
nada exista que obriga, pois depende de cada um, e enquanto aqui se encontra
progredimos de tal modo, que possa merecer ascender a ordem mais adiantada.
Nenhum prisioneiro saindo da prisão preocupa-se em voltar para ela; o meio,
para ele, é muito simples, apenas não cair em nova falta. Também O soldado,
acharia muito cômodo tornar-se marechal de um só golpe; todavia conquanto
houvesse sido alçado ao mais alto posto sem por isso estaria dispensado de
conquistar esporas.
Remontamos agora o curso dos tempos presente como ponto conhecido
procurando deduzir do desconhecido ao menos por analogia
Remontemos agora à escala dos tempos; e, do presente, como
ponto conhecido, tratemos de dirigir o desconhecido, pelo menos por analogia,
se não tivermos uma certeza de uma demonstração matemática.
A questão de Adão, como tronco único da espécie humana, é como se
sabe muito controvertida, porque as leis antropológicas nos demonstram a
impossibilidade, sem falar dos documentos autênticos da história chinesa que
provam que a população do globo remonta a uma época muito anterior atribuída à Adão
pela cronologia bíblica. Então A história de Adão é pura invencionice? Não é provável; essa é uma imagem que, como
todas as alegorias, deve encerrar uma grande verdade cuja chave só poderá ser
dada pelo Espiritismo. Em nossa opinião A questão principal, não é saber se a
personagem de Adão realmente existiu, nem em qual época viveu, mas se a raça
humana, designada como sua posteridade, é uma raça decaída. A solução desta
questão não é destituída de conteúdo moral, porque esclarecendo-nos quanto ao
passado pode orientar nossa conduta quanto o futuro.
Antes de mais notemos, que aplicada ao homem a ideia da queda sem
a reencarnação é um contrassenso assim como a responsabilidade de carregarmos
pela falta de nosso primeiro pai. Se a alma de cada homem é criada ao nascer, é
que não existia antes; não terá desse modo não terá desse modo nenhuma relação,
nem direta nem indireta, com a que cometeu a primeira falta, o que nos leva a
indagar, como poderia ser responsável por sua própria queda? A dúvida, sobre esse ponto, conduz
naturalmente à dúvida, ou mesmo pela incredulidade, sobre muitos outros, porquanto,
se falso é o ponto de partida, igualmente falsas devem ser as consequências.
Tal o raciocínio de muita gente. Pois bem! esse raciocínio cairá se considerarmos
o espirito, não a letra do texto bíblico,
e se nos reportarmos aos próprios princípios neutros da Doutrina
Espírita, destinada, conforme já foi dito, a realizar pela fé que se extingue.
Notemos, ainda, que a ideia dos anjos rebeldes, dos anjos
decaídos, e do paraíso perdido, se acha em quase todas as religiões, e, como
tradição, em quase todos os povos; deve, pois, fundamentar-se numa verdade. Para compreender o verdadeiro
sentido e viabilizar à qualificação de anjos rebeldes, não é necessário supor
uma luta real entre Deus e os anjos, ou Espíritos, desde que o vocábulo anjo
aqui é tomado numa acepção geral. Admitindo-se que sejam os homens Espíritos
encarnados, os que são materialistas e ateus e não anjos ou Espíritos em
revolta contra a Divindade, os que negam a sua existência e que não conhecem
seu poder, nem suas leis?
Não é por orgulho que pretendem dizer e tudo aquilo que são
capazes, vem deles mesmos e não de Deus?
Não é o cúmulo da rebelião o de pregar o nada depois da morte?
Não são muito culpáveis os que servem da inteligência, para
arrastarem seus semelhantes aos precipícios da incredulidade?
Até certo ponto não traficavam também um ato de revolta os que sem
negar a divindade desconhecem os verdadeiros atributos da sua essência? E os
que se cobrem com a máscara da crueldade para comprometer más ações?
E os que a fé no futuro não se desligam dos bens deste mundo?
E os que em nome de Deus o Pai violentam a primeira de suas leis,
a lei da caridade?
E os que semeiam a perturbação e o ódio pela calunia e pela
maledicência? Enfim Aqueles, cuja vida, voluntariamente inútil se escoa na
ociosidade, sem proveito para si próprios e para seus semelhantes?
A todos estão pedidas a conta não só do mal que fizeram, mas do
bem que deixaram de fazer. Pois bem! Todos esses Espíritos que tão mal empregaram
suas encarnações, uma vez expulsos da Terra enviados para mundos inferiores,
entre os povos ainda na infância e na barbárie, que serão senão anjos decaídos remetidos
a expiação? A Terra que deixam, não será para eles um paraíso perdido em
comparação com o meio ingrato onde vão se achar relegados durante milhares de
séculos, até o um dia que tenham merecido a sua libertação?
Se remontarmos agora à origem da raça atual, simbolizada na pessoa
de Adão, encontraremos todos os caracteres de uma geração de Espíritos expulsos
de um outro mundo, e exilados, por razões semelhantes, na Terra já povoada, por
homens primitivos, mergulhados na ignorância e na barbárie, e que tais exilados
tinham a missão de fazê-los progredir, trazendo ao seu meio as luzes de umas
inteligências já desenvolvidas. Não é, com efeito, o papel até aqui
representado pela raça adâmica?
Relegando-a para esta Terra, de trabalho e de sofrimento, Deus não
tem nada para dizer: " do suor de teu rosto
comeras o teu pão "?
E por causas semelhantes às que vemos hoje ela mereceu tal castigo,
não será justo dizer que se perdeu por orgulho? Na sua mansuetude, não lhe poderia
prometer que lhe enviaria um Salvador, isto é, aquele que deveria iluminar o
caminho a seguir para alcançar a felicidade dos eleitos?
Este salvador foi enviado na pessoa do Cristo, que ensinou a lei
de amor e a caridade, como a verdadeira âncora de salvação.
Aqui se apresenta uma importante consideração. A missão do Cristo
é facilmente compreendida admitindo-se que são os mesmos Espíritos que conviveram
antes e depois de sua vinda, e que, puderam aproveitar seu ensino, ou do mérito
de seu sacrifício; sem a reencarnação, porem fica mais difícil compreender e a
utilidade desse mesmo sacrifício para Espíritos criados posteriormente à sua
vinda, ou Deus, teria criado manchados por faltas cometidas por aqueles os
quais não tivera nenhuma relação.
Essa raça de Espíritos parece, ter completado o seu tempo na
Terra; nesse número, uns aproveitaram esse tempo para progredir e mereceram ser
recompensados; por outros, pela sua obstinação em cerrar os olhos à luz,
esgotaram a mansuetude do Criador e merecerão um castigo. Assim será cumprido
este trecho do Cristo: "Os bons ficarão à
minha direita e os maus à minha esquerda."
Um fato parece apoiar a teoria que atribui uma preexistência aos
primeiros habitantes dessa raça na Terra, é que Adão, é representado com um
desenvolvimento intelectual peculiar, bem superior ao das raças selvagens
atuais; em pouco tempo, os seus primeiros descendentes demostraram aptidão para
trabalhos de arte muito avançados. Ora, o que sabemos do estado dos Espíritos
em sua origem nos indica o que teria sido Adão, do ponto de vista intelectual, caso
sua alma houvesse sido criada ao mesmo tempo que o seu corpo. Admitindo-se que,
por exceção, que Deus lhe tivesse dado uma alma mais perfeita, restaria a
explicar porque os selvagens da Nova-Holanda, por exemplo, que saem do mesmo
tronco, são infinitamente mais atrasados do que o pai comum.
Ao contrário tudo prova, tanto pelo físico como pelo moral, que
pertencem a outra raça de Espíritos mais próximos da sua origem, e que ainda é
preciso um grande número de migrações corpóreas antes de atingirem os menos
avançado da raça adâmica. A nova era que vai surgir, fazendo reinar por toda a
parte a lei do Cristo, de justiça, de amor e de caridade, apressará o seu
adiantamento.
Os que escreveram a história da antropologia terrestre, se
apegaram principalmente aos caracteres físicos; o elemento espiritual, foi quase
sempre, negligenciado, isto é, necessariamente, pelo escritor que não admitem
nada fora da matéria. Quando esse for levado em conta no estudo das ciências,
uma luz inteiramente nova será lançada sobre uma porção de questões ainda
obscuras, porquanto o elemento espiritual é uma das forças vivas da Natureza,
desempenhando um papel preponderante tanto nos fenômenos físicos, quanto nos
fenômenos morais.
Eis, em pequena escala, um exemplo surpreendente de analogia com o
que se passa em escala maior no mundo dos Espíritos, e que nos ajudará a
compreendê-lo.
No dia 24 de maio de
1861, a fragata Iphigénie transportou para à Nova Caledônia uma companhia disciplinar
composta de 291 homens: na chegada o comandante baixou-lhes, uma ordem do dia, concebida assim:
"Pondo o pé sobre
esta terra longínqua, por certo já compreendestes o papel que vos está
reservado.
"A exemplo de
nossos bravos soldados da nossa marinha, que servem sob as nossas vistas,
ajudarão a levar o brilho e o facho, da civilização e das tribos selvagens da Nova Caledônia. Não é uma nobre e bela e
missão?
"Escutai a voz e
os conselhos de vossos chefes. Eu estou no seu comando;
que as minhas palavras
sejam bem entendidas.
"A escolha de
vosso comandante, de vossos oficiais, de vossos suboficiais e cabos constitui
garantia certa de que todos os esforços serão tentados para fazer, excelentes
soldados, digo mais, para vos elevar à altura de bons cidadãos e vos
transformar em colonos honrados, se quiseres.
"à nossa
disciplina é severa; e assim tem que ser. Colocada em nossas mãos, ela será
firme e inflexível, ficais certos; do mesmo modo, que justa e paternal, saberá
distinguir o erro do vício e da degradação..."
ai está um punhado de
homens expulsos, por seu um proceder de um país civilizado, e mandados, por
punição, para o meio de um povo bárbaro.
Que lhes disse o chefe? "Infringistes as leis de vosso país; e nele vos tornaram a causa de
perturbação e de escândalo, e por isso fostes expulsos;
mandaram-vos para
aqui, para aqui para resgatar o vosso passado; podeis, pelo trabalho, criar uma
posição honrosa, e vos tornar cidadãos honestos.
Tendes aqui uma bela
missão a cumprir, a de levar a civilização entre essas tribos selvagens. A
disciplina será severa, mas justa, e saberemos distinguir aqueles que se
conduzirem bem."
Para esses homens,
relegados ao seio da selvageria, a mãe-pátria não é um Paraíso perdido pela sua
falta e pela sua rebeldia contra à lei? Sobre essa terra longínqua, não sois
anjos decaídos? A linguagem do chefe não é a que Deus deverá fazer ouvir os
Espíritos exilados sobre a Terra?
"Desobedecestes
às minhas leis, e é por isso que vos expulsei do país em que poderíeis viver
feliz e em paz; aqui sereis condenados ao trabalho, mas podereis, pela vossa boa
conduta, merecer vosso perdão e reconquistar a pátria que perdestes pela vossa
falta, quer dizer, o céu."
À primeira vista, a ideia da queda parece em contradição com o princípio de que
os Espíritos não podem retrogradar; mas é preciso considerar que não se trata
de um retorno para o estado primitivo; o Espírito, embora numa posição
inferior, não perde nada do que adquiriu; seu desenvolvimento moral e
intelectual é o mesmo, qualquer que seja o meio onde esteja colocado. Ele está
na posição de um homem do mundo, condenado à prisão por seus erros; certamente,
ele caiu do ponto de vista social, mas não se torna nem mais estúpido, nem mais
ignorante.
Crê-se, agora, que esses homens, enviados à Nova Caledônia, vão se transformar
subitamente em modelos de virtudes? Que vão abjurar, de repente, seus erros
passados? Seria preciso não conhecer a Humanidade para o supor. Pela mesma
razão, os Espíritos que vão ser expulsos da Terra, uma vez transplantados nos
mundos de exílio, não vão se despojar instantaneamente de seu orgulho e de seus
maus instintos; por muito tempo ainda, conservarão as tendências de sua origem,
um resto do velho fermento. Deve ter ocorrido o mesmo com a raça adâmica
exilada sobre a Terra; ora, não está aí o pecado original? A tarefa que eles trazem,
ao nascer, é a da raça de Espíritos culpados e punidos à que eles pertencem;
tarefa que podem encobrir pelo arrependimento, pela expiação, e pela renovação
de seu ser moral. O pecado original, considerado como a responsabilidade de uma
falta cometida por outrem, é um contrassenso e a negação da justiça de Deus;
considerado, ao contrário, como consequência e saldo de uma imperfeição
primeira do indivíduo, não só a razão a admite, mas se considera de toda
justiça a responsabilidade que dela decorre.
FONTE:
Revista
espirita 1862
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