BEM-AVENTURADOSOS
PACIFICADORES, PORQUE ELES SERÃOCHAMADOS
FILHOS DE DEUS
Paz...Há quase
dois mil anos que os arautos de Deus cantaram sobre o estábulo de
Belém: “Paz na
terra aos homens de boa vontade”.
E alguns decênios
depois, em vésperas de sua morte, disse o Nazareno aos seus discípulos: “Eu vos
dou a paz, eu vos deixo a minha paz; não a dou como o mundo a dá, para que
minha alegria seja em vós, seja perfeita a vossa alegria, e nunca ninguém tire
de vós a vossa alegria".
Depois da sua
ressurreição, Jesus saúda os seus discípulos, invariavelmente, com as palavras:
“Salem alelkum”, a paz seja convosco.
Entretanto, a
história do cristianismo, que nasceu sob o signo da paz, é uma história de
guerras e de armistícios, mas não de paz. O armistício é uma pseudo paz, uma
trégua entre duas guerras.
O nosso ego
humano nada sabe de paz, só conhece guerra – a guerra quente nos campos de
batalha, ou então a guerra fria do armistício, nos parlamentos.
Por isto dizia o
Mestre: “Eu vos dou a paz, mas não a dou como o mundo a dá”, em forma precária
de pseudo paz ou armistício.
Aliás, quando o
ego nasceu, como refere o Gênesis, já nasceu beligerante, lutando para os dois
lados, guerreando o mundo de Deus e o Deus do mundo: “Porei inimizade entre ti
e a mulher, entre teu descendente e o descendente dela (o Cristo); ele te
esmagará a cabeça e tu armarás cilada ao calcanhar dele! ”.
Esta é a guerra
do anticristo contra o Eu crístico.
E também entrou
em guerra contra o mundo natural: “Comerás o teu pão no suor do teu rosto...
num mundo coberto de espinhos e abrolhos”.
E que fez o ego
da nossa personalidade até hoje senão combater Deus e a natureza? Nunca a
humanidade gozou de um único ano de paz verdadeira.
Bem dizia a
Bhagavad Gita: “O ego é o pior inimigo do Eu, mas o Eu é o melhor amigo do
ego”.
Para que haja paz
entre a personalidade humana do ego e a individualidade crística do Eu, deve o
homem elevar-se à altura do Cristo, porque este não pode descer às baixadas do
ego.
A paz social,
nacional e internacional depende da paz individual. Enquanto o homem não fizer
as pazes consigo mesmo, não pode ter paz com os outros.
Todo e qualquer
tratado de paz no mundo político-social acabará infalivelmente numa guerra
quente, nos campos de batalha, ou então numa guerra fria nos parlamentos. As
leis cósmicas são de uma lógica retilínea inexorável: nada há no mundo social
que antes não tenha havido no mundo individual.
Sempre de novo,
através de séculos e milênios, o homem tenta subornar as leis cósmicas, que são
a ordem de Deus: sempre de novo tenta fazer o segundo antes do primeiro – e o
círculo vicioso continua sem fim.
O homem tem de
pacificar-se a si mesmo, antes de poder pacificar os outros.
“Bem-aventurados
os pacificadores...”
A tradução
habitual diz “pacíficos”. Embora esta palavra seja certa em si, hoje em dia é
ela mal compreendida. Pacífico é, para o homem comum, um homem calmo, passivo,
mais ou menos inerte. Mas o termo latino é derivado de pacemfacere, fazer a
paz, bem como a expressão grega eirenepoiuntes, derivada deeirene (paz) e poieo
(fazer). O sentido desta palavra é, sobretudo, ativo e dinâmico, e não
estaticamente passivo. Feliz é o homem que faz ou realiza a paz, e não apenas
vive ou vegeta pacificamente.
A paz não
representa um estado de passividade e inércia, mas é uma conquista, uma
vitória, altamente dinâmica. Pode o homem viver numa espécie de paz comparável
à dos cemitérios, onde ninguém briga com os outros, mas todos estão em paz por
falta de vida e vitalidade. Mas não é esta a paz desejável; a paz verdadeira é
uma bonança que segue a uma grande tempestade, é a tranquilidade final da
sapiência depois de uma longa tormenta de dúvidas e incertezas.
Durante a última
guerra mundial apareceu numa revista uma ilustração satírica: um enorme campo
cheio de cruzes, uma ao lado da outra, um cemitério onde tinham sido sepultados
milhares de soldados mortos na guerra – alemães, franceses, russos, ingleses,
italianos etc., e a legenda dizia: “finalmente a paz mundial”.
Esses
beligerantes tinham conseguido a paz graças à perda da vida. A verdadeira paz,
porém, não é uma paz por ausência de vida, mas sim uma paz pela presença e plenitude
da vida, por uma vivência tão plena e exuberante que todas as desarmonias
culminaram em perfeita harmonia.
Por isso dizia o
Mestre: “Eu vim para que os homens tenham a vida, e a tenham em maior
abundância”.
O homem-ego não
tem paz, porque não está na plenitude da vida, vive apenas uma semivida, quiçá
uma pseudo vida, e por isto tem de brigar com os outros, porque está em
discórdia consigo mesmo.
A solução não
está numa diminuição de vida, mas sim numa intensificação devida. Se todos os
homens tivessem a plenitude da vida, a consciência do seu Eu divino, haveria
paz individual e paz universal.
A verdadeira paz
é a coisa mais dinâmica e realizadora do mundo; o homem auto pacificador e auto
pacificado é o campeão das grandes realizações; ele sabe que paz é um poder
silencioso, uma potência irresistível, que faz lembrar o curso silencioso dos
astros pelas vias inexploradas do cosmos, ou a irresistível dinâmica da
natureza, que tudo vence sem o menor ruído.
A verdadeira paz
tem afinidade com o mundo da metafísica, e não da física, como mundo da
invisível realidade, e não das facticidades visíveis.
A principal
tarefa do homem, aqui na Terra, é estabelecer o grande tratado de paz dentro de
si mesmo.
Toda a falta de
paz que desgraça a pobre humanidade provém unicamente da falta de equilíbrio e
harmonia entre o ego da humana personalidade e o Eu divino da sua alma. Aqui no
Ocidente, é regra geral que o ego humano – material, mental e emocional – se
preocupe com a vida humana sem se importar com o seu destino divino. “Que
aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se sofrer prejuízo em sua própria alma?
” – estas palavras do Cristo enunciam, em forma lapidar, toda a tragédia da
vida humana: o homem corre freneticamente atrás dos bens deste mundo, sem se
importar com o bem-estar de sua alma. Mas essa diversidade dispersiva, sem a
devida unidade concentrativa, tende a acabar fatalmente num caos centrífugo,
que, na medicina, chama-se “frustração”, que quer dizer despedaçamento ou
esfacelamento. É precisamente este o programado anticristo, no episódio da
tentação: “Eu te darei todos os reinos deste mundo e sua glória – prostra-te em
terra e adora-me”.
O homem ocidental
é um homem visceralmente centrífugo, dispersivo, fragmentado, frustrado, e por
isto não tem paz, que é o apanágio da harmonia, ou seja, da unidade na
diversidade.
Alguns orientais
caíram no extremo oposto, abolindo a diversidade a favor da unidade,
substituindo a atividade do ego pela passividade do Eu; em vez de realizarem
uma mística sadia, sucumbiram a um misticismo doentio.
O homem integral,
porém, não é um profano dispersivo, nem apenas um místico concentrativo. O
homem cósmico estabeleceu dentro de si o grande tratado de paz, a harmonia, o
equilíbrio entre o seu centro divino e as suas periferias humanas. O homem
integral é cósmico ou univérsico, porque é governado pelas mesmas leis que
regem o mundo sideral, cuja atração centrípeta é perfeitamente equilibrada pela
repulsão centrífuga.
A harmonia
cósmica do homem, que se chama paz, é, pois, o resultado da realização do homem
bipolar.
O homem que se
pacificou a si mesmo por meio dessa lei de equilíbrio irradia paz e harmonia ao
redor de si, na vida doméstica, social, nacional e internacional.
O auto
pacificador é, mesmo inconscientemente, um alo pacificador. Não há necessidade
que fale muito em paz, nem que faça congressos ou comícios pró-paz – basta que
ele mesmo seja um centro e uma fonte da verdadeira paz – e o mundo será
pacificado por esse centro de paz dinâmica.
Paz, já o
dissemos, não quer dizer passividade, inércia, inatividade. A verdadeira paz é
essencialmente dinâmica, ativa, realizadora, transbordando para todos os lados,
assim como o globo solar irradia luz, calor, vida e beleza por todas as
latitudes e longitudes do Universo.
Os verdadeiros
pacificados e pacificadores, diz o Mestre, são chamados “filhos de Deus”. Sendo
Deus a infinita e eterna paz do Universo, que outra coisa poderiam os filhos de
Deus ser, senão esta mesma paz?
Basta que exista
algures um centro de paz dinâmica para que o mundo tenha paz.
Mas esse centro
de paz dinâmica supõe autoconhecimento e auto-realização.
Enquanto o homem
não se conhece a si mesmo, confundindo o seu ego-humano com o seu Eu divino,
não há conhecimento da verdade sobre si mesmo, e por isto não há libertação
pela verdade. O primeiro passo para a realização do grande tratado de paz é a
eterna pergunta: “Que sou eu? ”.
A resposta foi
dada por todos os grandes Mestres da humanidade, sobretudo pelo Cristo, quando
identificou o centro do homem com o Pai, com a Luz, com o Reino de Deus, com o
Tesouro Oculto, com a Pérola Preciosa, com uma Fonte de águas vivas.
Quando o homem
realiza em si esse Reino de Deus, verificará, talvez com grande surpresa, que
não perdeu as coisas do seu ego humano, mas as possui mais firme e
autenticamente. Quem possui o mais possui o menos – mas quem procura possuir
este à custa daquele perde tanto o menos como o mais. Quem quer salvar o seu
ego humano, sacrificando o Eu divino, perderá tudo; mas quem está disposto a
renunciar ao ego humano a fim de possuir o Eu divino, verificará que, além de
salvar este, salvou também aquele, uma vez que a redenção do TODO implica na
redenção da parte. “Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e sua harmonia –
e todas as outras coisas vos serão dadas de acréscimo”.
Em véspera de sua
morte disse o Mestre aos seus discípulos: “Eu vos dou a paz, mas não a dou como
o mundo a dá”. Promete-lhes uma paz com alegria. Uma paz passiva seria uma paz
com tristeza, uma vez que a atividade é alegria, e a passividade é tristeza.
Esta paz que o Mestre tinha em si, mesmo em face da morte, é a paz que ele quer
ver em seus discípulos, não pode ser destruída nem pela perspectiva da morte,
nem pela traição, negação e fuga de seus discípulos.
Esta paz, que o
mundo não pode dar e que o mundo não pode tirar, é totalmente inatingível pelas
circunstâncias externas. Podem, sim, as circunstâncias adversas causar
sofrimento e tristezas, como aconteceu até ao Nazareno, mas não podem destruir
a paz e felicidade da alma. As tempestades revolvem a superfície do mar, mas na
sua profundeza continua absoluta quietação e tranquilidade. A soberania da
substância divina do homem não é atingida pelas tiranias das circunstâncias
humanas. A paz de dentro persiste no meio de todas as guerras de fora. É a
grande declaração da independência espiritual no meio de todas as escravidões
materiais e sociais.
A verdadeira paz
dos filhos de Deus é silenciosamente dinâmica, age como senão agisse, realiza
grandes coisas sem arrombar portas e sem esmagar ninguém; não atua com o
estampido da explosão de uma bomba, mas com à taciturna potência com que o sol
e as estrelas traçam as suas silenciosas órbitas pelo espaço infinito. A paz é
silenciosamente poderosa, anonimamente irresistível, move os maiores pesos com
leveza, faz com facilidade as coisas mais difíceis, abrange com suavidade todo
o Universo de uma à outra extremidade, “não se ouve o seu clamor nas ruas, não
quebra a cana fendida, nem apaga a mecha ainda fumegante”.
O homem que
encontrou a paz dentro de si mesmo não é apressado, nervoso, agitado, porque em
qualquer trecho da sua jornada está sempre no termo e na meta de todas as suas
viagens. O seu centro, como o de Deus, está em toda parte, e a sua querência
está em sua própria consciência; a meta de todos os seus métodos coincide com o
Infinito, como a geometria diz das linhas paralelas.
A paz do homem auto
pacificado pela verdade sobre si mesmo exala uma indefinível serenidade. Todos
se sentem bem e felizes na presença desse homem que conquistou a paz depois de
grandes lutas consigo mesmo. A sua serenidade dinâmica envolve e permeia todo o
ambiente, como um fluido magnético, como uma aura suavemente poderosa, como um
banho de luz e força. E todas as almas receptivas se sentem tão bem nesse Tabor
de transfiguração que estão com vontade de dizer: Mestre, que bom que é estarmos
aqui... vamos aqui armar as nossas tendas, porque aqui moram os filhos de Deus
e aqui impera o Reino dos Céus...
Um único homem
realmente pacificador e pacificado dentro de si mesmo vale mais para a paz
universal do mundo do que todos os pretensos fazedores de paz que não
realizaram a paz dentro de si mesmos.
“Bem-aventurados
os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus. ”
Jesus
Cristo é o Príncipe da Paz.
“A
paz vos deixo, a minha paz vos dou”, disse Ele, pouco antes de sua morte. “Não
vo-la dou como o mundo a dá”, isto é, sob a forma de armistício, frágil e
incerto, cuja estabilidade pode romper-se a qualquer momento, mas sim em
caráter firme e absoluto.
Esse
dom da graça divina, entretanto, para que se estabeleça em nossa alma,
impregnando-a de suave beatitude, exige condições de receptividade, ou seja, a
extinção do orgulho e de todos os desejos egoístas, porquanto são esses
sentimentos inferiores que inspiram todas as discórdias e promovem todas as
lutas que se verificam na face da Terra.
Sim,
para que esse carisma seja uma realidade em nossa vida, mister se faz
despertemos nossa consciência espiritual.
Libertemo-nos
das ilusões do plano físico e identifiquemo-nos com as verdades do Mundo Maior;
sem essa experiência, haveremos de ser, sempre, criaturas agitadas e
descontentes, em permanente desarmonia com nós mesmos e com aqueles que nos
cruzam o caminho.
Enquanto
não haja pacificação individual, enquanto os homens não se sentirem
harmonizados intimamente, os conflitos exteriores, tanto no recinto doméstico,
como no campo social, hão de subsistir, fatalmente, sendo baldados todos os
recursos que se empreguem para aboli-los.
Bem-Aventurado aquele que, numa busca pessoal,
ingente, descubra o seu Cristo interno e, renunciando ao seu pequenino ego
humano, unifique-se com Ele, passando a viver, não mais com mira no próprio
proveito, mas desejando ardentemente vir a ser um veículo pelo qual o Amor
divino possa chegar até aos seus irmãos. Esse terá encontrado a “pérola
preciosa” de que nos fala a parábola evangélica, e desde então, na posse desse
tesouro inapreciável, gozará de uma paz e uma alegria perfeita, que nenhum
sucesso vindo de fora será capaz de perturbar.
Alcançando
esse estado de alma, dominará o ambiente exterior e, onde quer que se encontre,
mesmo sem dizer palavra, simplesmente com a sua presença, influirá
beneficamente sobre os que o rodeiam.
Junto
a si, mercê das forças espirituais superiores que irradia, todos se sentirão
aliviados, tranquilos e seguros; uma indizível sensação de calma e de bem-estar
descerá qual orvalho sobre os corações desgostosos e conturbados.
Os
seguidores do Cristo devem dar-se a conhecer pelos esforços que empreendam em
favor da paz.
Sejam,
pois, nossos pensamentos, palavras e ações, uma contribuição constante no
sentido de erradicar do mundo (começando primeiramente por nós) a inveja, as
suspeitas, o ódio, a vingança e o espírito de contenda.
Se
assim o fizermos, se adquirirmos a qualificação de pacificadores, mereceremos
ser chamados filhos de Deus, bem como a glória de ser participantes da paz celestial.
A PACIÊNCIA. A
dor é uma bênção que Deus envia a seus eleitos; não vos aflijais, pois, quando
sofrerdes; antes, bendizei de Deus onipotente que, pela dor, neste mundo, vos
marcou para a glória no céu. Sede pacientes. A paciência também é uma caridade
e deveis praticar a lei de caridade ensinada pelo Cristo, enviado de Deus. A
caridade que consiste na esmola dada aos pobres é a mais fácil de todas. Outra
há, porém, muito mais penosa e, conseguintemente, muito mais meritória: a de
perdoarmos aos que Deus colocou em nosso caminho para serem instrumentos do
nosso sofrer e para nos porem à prova a paciência. A vida é difícil, bem o sei.
Compõe-se de mil nadas, que são outras tantas picadas de alfinetes, mas que
acabam por ferir. Se, porém, atentarmos nos deveres que nos são impostos, nas
consolações e compensações que, por outro lado, recebemos, havemos de
reconhecer que são as bênçãos muito mais numerosas do que as dores. O fardo
parece menos pesado, quando se olha para o alto, do que quando se curva para a
terra a fronte. Coragem, amigos! Tendes no Cristo o vosso modelo. Mais sofreu
ele do que qualquer de vós e nada tinha de que se penitenciar, ao passo que vós
tendes de expiar o vosso passado e de vos fortalecer para o futuro. Sede, pois,
pacientes, sede cristãos. Essa palavra resume tudo.
FONTE:
Huberto Rodhen
Grupo
de Fraternidade Espírita João Ramalho
O
Sermão da Montanha – Rodolfo Calligares
ESE – Joanna de
Ângelis
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