POSSESSÃO
PARTILHADA (PARCEIROS NO VÍCIO)
Procuramos
abordar aqui a obsessão, genericamente 1conhecida como de encarnado para
desencarnado.
A dificuldade de
classificação é muito grande porque há casos em que a predominância do
encarnado é franca e inequívoca; outros em que ela é variável, em escala de 80%
a 60%; e outros ainda - e estes em maior número - em que a responsabilidade
fica repartida em partes iguais, meio a meio.
Na obra de André
Luiz, não há um exemplo típico de predomínio da vontade do encarnado sobre o
desencarnado. Sobre esse assunto, os centros espíritas poderiam apresentar suas
próprias estatísticas, contribuindo para esse estudo. Na verdade, muitas vezes nos
perguntamos, se não deveríamos colocar a Possessão Partilhada entre as obsessões
espiríticas, já que o termo possessão está indicando a subjugação de um
encarnado por espírito já desenfaixado da matéria. Na série André Luiz, fica
bem claro, porém, que na maioria dos casos de viciados, de qualquer natureza, a
responsabilidade do espírito encarnado é muito grande; referindo-se,
especificamente, ao conluio entre Cláudio Nogueira e os parceiros
desencarnados, Félix teve oportunidade de dizer que, em nenhum momento, Cláudio
fora constrangido a aceitar a companhia do outro. A escolha fora dele. A
responsabilidade estava dividida em quotas iguais, porque era uma associação natural,
uma parceria consentida.
CASO CLÁUDIO NOGUEIRA
Acompanhemos esse
caso em Sexo e Destino:
Félix e André
Luiz alcançaram o espaçoso apartamento do Flamengo, no Rio de Janeiro,
adentrando a residência de Cláudio Nogueira.
No limiar do
recinto doméstico, os benfeitores espirituais surpreenderam dois homens
desencarnados a debaterem casos de vampirismo. Nenhum dos dois registrara a
presença dos Espíritos amigos. Prometiam arruaças. Semelhantes companhias
indicavam a falta de defesa daquele lar, os riscos a que se expunham os
moradores desse ninho de cimento armado, suspenso em enorme edifício.
Na sala
principal, escarrapachado no sofá, Cláudio lia um jornal vespertino, com
atenção. Em meio aos adornos delicados da peça, o contraste de uma garrafa de
uísque, deitando emanações alcoólicas no ambiente, que se casavam com o hálito
do dono da casa.
Cláudio Nogueira,
homem maduro, na quadra dos quarenta e cinco janeiros, lutando contra os
desgastes do tempo, tinha o rosto bem cuidado, os cabelos penteados com
distinção, unhas polidas, e envergava pijama impecável. Naquele momento, acompanhava
o jornal como quem estava à cata de notícias maliciosas, conservando entre os
dedos um cigarro fumegante. O cinzeiro próximo já estava repleto, indicando o
abuso da nicotina.
Repentinamente,
surgiram ambos os desencarnados infelizes que estavam na soleira da entrada,
abordando Cláudio, sem cerimônia. Um deles tateou-lhes os ombros e gritou: -
Beber, meu caro, quero beber!
A voz
escarnecedora agredia a sensibilidade auditiva de André Luiz e Félix. Cláudio,
embora não pudesse detectar-lhe o chamado pelos sentidos físicos, trazia a
acústica da mente sintonizada com o apelante, que repetiu a solicitação,
algumas vezes, na atitude do hipnotizador que insufla o próprio desejo,
repetindo uma ordem.
O resultado não
se fez esperar. O paciente desviou-se do artigo político no qual estava
interessado e sem que pudesse explicar a si mesmo, passou a deslocar o
pensamento noutra direção.
Beber, beber!... E
a sede de álcool se lhe articulou na ideia, ganhando forma. A mucosa pituitária
aguçou-se, como que impregnada do cheiro que vagueava no ar. O parceiro
desencarnado coçou-lhe brandamente os gorgomilos. Cláudio sentiu-se
apoquentado.
Indefinível
secura constrangia-lhe a laringe. Tinha necessidade de tranquilizar-se.
O amigo sagaz
percebeu-lhe a adesão tácita e colou-se a ele. De começo, a carícia leve;
depois o abraço envolvente; e finalmente o abraço de profundidade, a associação
recíproca.
Uma verdadeira
enxertia fluídica.
Cláudio-homem
absorvia o desencarnado, à guisa de sapato que se ajusta ao pé. Fundiram-se os
dois, como se morassem eventualmente num só corpo. Altura idêntica. Volume
igual. Movimentos sincrônicos. Identificação positiva.
Levantaram-se a
um tempo e giraram integralmente incorporados um ao outro, na área estreita,
arrebatando o delgado frasco.
André Luiz não
saberia especificar a quem atribuir o impulso inicial de semelhante gesto, se a
Cláudio que admitia a instigação ou se ao obsessor que a propunha.
A talagada rolou
através da garganta, que se exprimia por dualidade singular. Ambos os
drogaditos estalaram a língua de prazer, em ação simultânea.
Desmanchou-se a
parelha e Cláudio, desembaraçado, se dispunha a sentar, quando o outro colega,
que se mantinha a distância, investiu sobre ele e protestou: eu também, eu também
quero!
Absolutamente
passivo diante do apelo que o assaltava, reconstituiu, mecanicamente, a
impressão de insaciedade.
Bastou isso, e o
vampiro, sorridente, apossou-se dele, repetindo-se o fenômeno da conjugação
completa.
Encarnado e
desencarnado a se justaporem. Duas peças conscientes, reunidas em sistema
irrepreensível de compensação mútua.
André Luiz
acompanhou a posição mental de Cláudio e pode constatar que ele continuava
livre no íntimo. Não experimentava qualquer tortura, a fim de render-se.
Hospedava o outro, aceitando-lhe a direção, entregando-se por deliberação
própria. Não era caso de simbiose em que se destacasse por vítima. Era uma
associação natural.
Félix explicou
que não se tratava de temíveis obsessores como poderia parecer. E ponderou:
- Cláudio
desfruta de excelente saúde física. Cérebro claro, raciocínio seguro. E
inteligente, maduro, experimentado. Não carrega inibições corpóreas que o
recomendem a cuidados especiais. Sabe o que quer. Possui materialmente o que
deseja. Permanece no tipo de vida que procura. E natural que esteja respirando
a influência de companhias que julgue aceitáveis. Retém liberdade ampla e
valiosos recursos de instrução e discernimento para juntar-se aos missionários
do bem que operam entre os homens, assegurando edificação e felicidade a si
mesmo. Se elege para comensais da própria casa os companheiros que acabamos de
ver, é assunto dele.
Félix descartou
qualquer possibilidade de expulsar as companhias de Cláudio, principalmente
porque o dono da casa os tinha à conta de sócios estimáveis, amigos caros. Há
também que se considerar se os vínculos seriam de agora ou de existência passada.
A violência para
separar os parceiros seria totalmente desaconselhada, em qualquer caso,
sobretudo neste de parceria consentida.
A
responsabilidade tem o tamanho do conhecimento, lembrou Félix.
Não podemos
impedir que um amigo contraia dívidas ou despenque em desatinos deploráveis,
conquanto nos seja lícito dar-lhe o auxílio possível. Neste sentido foi a
explicação de Félix.
A justiça humana
apenas cerceia as manifestações de alguém, quando esse alguém compromete o
equilíbrio e a segurança dos outros, deixando a cada um o direito de agir como
melhor lhe pareça. Como a Espiritualidade poderia agir de outra forma, desrespeitando-o
livre-arbítrio, ou seja, a liberdade de escolha das companhias que desejamos
usufruir?
Muitas vezes, os
benfeitores espirituais providenciam doenças ou impedimentos temporários para
chamar a atenção do encarnado, quanto ao caminho enganoso escolhido. Mas essas
são providências restritas, surgem como advertências dos que nos amam, quando
mereçam esse amparo de exceção.
Mais tarde,
Cláudio, enrodilhado a um dos seus parceiros Moreira - vai tentar vencer as
defesas morais da jovem Manta, a filha que ele julgava ser adotiva.
André Luiz
descreve assim essa parceria: O verbo enrodilhar-se, na linguagem humana,
figura-se o mais adequado a definição daquela ocorrência de possessão
partilhada, que se nos apresentava ao exame, conquanto não exprima, com
exatidão, todo o processo de enrolamento fluídico, em que se imantavam. E
afirmamos possessão partilhada, porque, efetivamente, ali, um aspirava
ardentemente aos objetivos desonestos do outro, completando-se, euforicamente,
na divisão da responsabilidade em quotas iguais.
Qual acontecera,
no instante em que bebiam juntos, forneciam a impressão de dois seres num corpo
só.
Ao entrarem no
quarto de Manta, Cláudio e o parceiro estavam singularmente brutalizados pelo
desejo infeliz, constituíam juntos uma fera astuciosa.
André Luiz
descreve esse instante: A incorporação medianímica, espontânea e consciente,
positivava-se em plenitude selvagem. O fenômeno da comunhão entre duas
inteligências -uma delas, encarnada, e a outra, desencarnada- levantava-se,
franco; ainda assim, desdobrava-se tão agreste quanto o furacão ou amar é, que
se expressam por forças ainda desgovernadas da Natureza terrestre...
Conforme explica
o benfeitor, toda a cena passava-se no plano mental, no silêncio, sem que a
pobre jovem percebesse.
Não vou entrar em
maiores detalhes deste livro extraordinário. Sexo e Destino merece ser levado
ao cinema e adaptado para uma série de televisão: é uma contribuição notável dos
Espíritos Superiores para a valorização do emprego das energias sexuais e um
cântico à vitória do amor universal.
PARCEIROS NO VÍCIO
No livro Nos
Domínios da Mediunidade, o assistente Aulus, André Luiz e Hilário observavam
uma casa noturna, onde se reuniam fumantes e bebedores inveterados.
O ambiente
saturado de emanações negativas produzia mal-estar nos três observadores
espirituais. Junto dos encarnados que fumavam e bebiam, criaturas de triste
feição se demoravam expectantes. Algumas sorviam as baforadas de fumo
arremessadas ao ar, ainda aquecidas pelo calor dos pulmões que as expulsavam,
nisso encontrando alegria e alimento. Outras aspiravam o hálito de alcoólatras
inveterados.
Aulus explicou
que os desencarnados que se apegam com desvario às sensações da experiência
física, ficam colados aos amigos terrestres, temporariamente desequilibrados
nos costumes porque se deixam influenciar. Esses nossos companheiros situaram a
mente nos apetites mais baixos do mundo, alimentando-se de emoções tipo
inferior que os localiza na vizinhança da animalidade. Na Terra, preferiram o
culto das satisfações menos dignas.
Como cada alma
recebe da vida de conformidade com aquilo que dá, não encontram interesse senão
nos lugares onde podem nutriras ilusões que lhes são peculiares. Tinham medo da
verdade, eram como a coruja que foge da luz.
Como essas almas
transformar-se-ão?
Áulus responde
que há mil processos de reajuste, no Universo Infinito em que se cumprem os
desígnios do Senhor, chamem-se eles aflição, desencanto, cansaço, tédio,
sofrimento, cárcere....
O que seria a
prisão regeneradora? Desejou saber Hilário.
Áulus explicou:
Há dolorosas reencarnações que significam tremenda luta expiatória para as
almas necrosadas no vício. Temos, por exemplo, o mongolismo, a hidrocefalia, a
paralisia, a cegueira, a epilepsia secundária, o idiotismo, o aleijão de
nascença e muitos outros recursos, angustiosos embora, mas necessários, e que
podem funcionar, em benefício da mente desequilibrada, desde o berço, em plena
fase infantil. Na maioria das vezes, semelhantes processos de cura prodigalizam
bons resultados pelas provações obrigatórias que oferecem....
Áulus ressaltou
ainda que era possível a recuperação aqueles Espíritos, pela renovação menta
contribuindo para a consequente melhoria dos encarnados, mas precisariam despender
esforço heroico.
Observando os
beberrões, cujas taças eram partilhadas pelos sócios que lhes eram invisíveis,
Hilário fez uma observação e uma pergunta:
- Ontem,
visitamos um templo, em que desencarnados sofredores se exprimiam por
intermédio de criaturas necessitadas de auxílio, e ali estudámos algo sobre
mediunidade
... aqui, vemos
entidades viciosas valendo-se de pessoas que com elas se afinam numa perfeita
comunhão de forças inferiores... aqui, tanto quanto lá, seria lícito ver mediunidade
em ação?
Aulus confirmou:
Sem qualquer dúvida; recursos psíquicos, nesse ou naquele grau de
desenvolvimento, são peculiares a todos, tanto quanto o poder de locomoção ou a
faculdade de respirar, constituindo forças que o Espirito encarnado ou
desencarnado pode empregar no bem ou no mal de si mesmo. Ser médium não quer
dizer que a alma esteja agraciada por privilégios ou conquistas feitas. Muitas
vezes, é possível encontrar pessoas altamente favorecidas com o dom da
mediunidade, mas dominadas, subjugadas por entidades sombrias ou delinquentes,
com as quais se afinam de modo perfeito, servindo ao escândalo e a perturbação,
em vez de cooperarem na extensão do bem.
E concluiu: Por
isso é que não basta a mediunidade para a concretização dos serviços que nos
competem. Precisamos da Doutrina do Espiritismo, do Cristianismo Puro, a fim de
controlar a energia medianímica, de maneira a mobilizá-la em favor da
sublimação espiritual na fé religiosa, tanto quanto disciplinamos a
eletricidade, a benefício do conforto na Civilização.
No livro No Mundo
Maior, Calderaro explicou porque os alcoólatras inveterados costumam ter visões
estranhas de cobras, morcegos e outros bichos. No caso ao qual prestavam
assistência, o encarnado, sob o efeito do álcool, mantinha-se parcialmente
desligado do corpo físico, mas, dessa forma, passou a ter uma identificação
maior com as quatro entidades que o vampirizavam, e estas tinham a mente
invadida por visões terríveis do túmulo, que haviam atravessado como
alcoólatras.
Estudando esse
tema das forças viciadas, as formas como os parceiros de Cláudio atuaram sobre
ele, lembramo-nos de uma passagem que consta de um outro livro muito importante
da série: Libertação. Nele, há um apontamento do instrutor Gúbio quanto ao modo
de
atuar dos
Espíritos inferiores:
O espírito
encarnado sofre a influenciação inferior, através das regiões em que se situam
o sexo e o estômago, e recebe os estímulos superiores, ainda mesmo procedentes
de almas não sublimadas, através do coração e do cérebro.
Além dessa
observação importante, gostaríamos de ressaltar que os drogaditos não devem ser
tratados, primordialmente, como obsedados. Uma das lutas dos profissionais da
saúde, que atuam nessa área, é a de conscientizar o viciado em drogas ou
álcool, enfim, o dependente químico, de que precisa tratar-se, aderindo ao
esquema de desintoxicação, à psicoterapia, ao programa dos dez passos, e outros
mais indicados a cada caso.
É claro que o
tratamento espiritual na fase de manutenção do tratamento pode ser feito, desde
que o interessado se conscientize da sua necessidade de mudar e não descarte
sua responsabilidade, atribuindo sua doença à influência de desencarnados.
Embora
reconhecendo os diversos graus de parceria, somos levados a considerar, com o
estudo da obra de André Luiz, que o espírito do encarnado tem um papel
preponderante nesse tipo de ligação viciosa.
Há, nesses casos,
uma comunhão de forças negativas e, como já afirmamos, no início, muitas vezes,
fica difícil determinar a linha demarcatória entre a obsessão anímica e a
espirítica.
Fonte:
A Obsessão e Suas
Mascaras
Dra. Marlene
Nobre
No Mundo Maior
Evolução em Dois
Mundos
Libertação
Sexo e Destino
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